OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
A viúva quis ensaiar um gracejo, que disfarçasse a perturbação que começava<br />
a sentir, e disse sorrindo:<br />
– Já se viu como é moda hoje em dia pedir-se um passeio a uma senhora!<br />
– Passeemos!... tornou Salustiano.<br />
Mariana ergueu-se, e ainda para disfarce da perturbação, que nela ia<br />
crescendo, disse a suas amigas:<br />
– Não há remédio... a escrava levanta-se para acompanhar o seu senhor.<br />
Ao atravessar da sala, Mariana encontrou o olhar <strong>de</strong> Henrique <strong>de</strong>scontente,<br />
cuidadoso, e como lhe dirigindo uma queixa.<br />
– E disse bem, senhora, murmurou a seus ouvidos Salustiano com voz grave e<br />
terrível; disse bem; a escrava levantou-se para acompanhar a seu senhor.<br />
– Como?! exclamou a viúva; pois neste lugar, e a esta hora...<br />
– Neste lugar, em toda parte, e a todas as horas eu hei <strong>de</strong> persegui-la sempre!<br />
– Oh! senhor!...<br />
– Eu disse ser minha vonta<strong>de</strong> que a esta casa não voltasse esse mancebo, que<br />
<strong>de</strong>testo; impus-lhe a obrigação <strong>de</strong> fechar-lhe as portas; e hoje.... ei-lo aí... <strong>de</strong>vorando<br />
com os olhos a sua sobrinha...<br />
– Mas é que meu pai...<br />
– Sabe, senhora, que isso se chama abusar <strong>de</strong> minha paciência e <strong>de</strong>safiar-me?<br />
– É muito!... exclamou a mísera mulher.<br />
– Ignora que eu tenho em minhas mãos os meios <strong>de</strong> vingar-me; e que existe<br />
no seu coração um amor que eu posso <strong>de</strong>struir?..<br />
A figura do velho Anacleto, nobre e respeitável, apareceu aos olhos <strong>de</strong><br />
Mariana.<br />
– Pieda<strong>de</strong>! balbuciou ela: eis ali meu pai.<br />
Salustiano arrastou a infeliz viúva para uma outra sala, e prosseguiu:<br />
– Eu vou ter daqui a pouco uma hora <strong>de</strong> prática com o sr. Henrique.<br />
Mariana estava pálida como uma finada.<br />
– No fim <strong>de</strong>ssa hora estarei vingado.<br />
– Perdão!... murmurou a viúva ajuntando as mãos como se quisesse orar.<br />
– Pois então... senhora, hoje mesmo, e antes que termine o sarau, esse<br />
mancebo <strong>de</strong>verá ter para sempre <strong>de</strong>ixado esta casa.<br />
E abandonando Mariana, que foi cair quase <strong>de</strong>smaiada sobre uma ca<strong>de</strong>ira,<br />
Salustiano voltou à sala.<br />
<strong>CAPÍTULO</strong> XIX<br />
UM PAI QUE CHORA<br />
FAZIA um calor abrasante; apesar <strong>de</strong>le, porém, as moças e moços<br />
continuavam a dançar.<br />
Cândido <strong>de</strong>ixou a sala, e dirigiu-se ao jardim. Queria ver aquele lugar feliz,<br />
102