OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
– Já o adivinhaste, d. Mariquinhas?<br />
– Ora!...<br />
– Des<strong>de</strong> quando?<br />
– Des<strong>de</strong> antes <strong>de</strong> teus anos.<br />
– Foi na verda<strong>de</strong> bem cedo, respon<strong>de</strong>u Celina; porque então eu mesma apenas<br />
o suspeitava.<br />
– Não duvido; isso acontece. Mas então dizer-mo?<br />
– Para que, se tu já sabes?<br />
– Seria possível que eu estivesse em erro.<br />
– És muito viva para te enganares.<br />
– Pois bem, dir-te-ei eu o nome, é porém com uma condição.<br />
– Qual?<br />
– Se eu acertar, hás <strong>de</strong> confessá-lo.<br />
– Sim.<br />
– Chama-se...<br />
Celina olhou para Mariquinhas.<br />
– Cândido.<br />
A “Bela Órfã” abaixou a cabeça.<br />
– Adivinhei?<br />
– Adivinhaste, murmurou a moça.<br />
– Levanta a cabeça; conta-me o que tem havido; não foi para isso que nos<br />
reunimos hoje?<br />
Celina pensou um momento e disse:<br />
– Sou uma louca.<br />
– Tu?...<br />
– Sim; mas ao menos a minha loucura po<strong>de</strong>rá agora ser-me útil.<br />
– Como?...<br />
– Escrevi o que se tem passado comigo...<br />
– A história do teu amor?...<br />
– Sim...<br />
– Um romance?!<br />
– Não... uma verda<strong>de</strong>.<br />
– Como não?... pensas que os romances são mentiras?...<br />
– Tenho certeza disso.<br />
– Neste ponto estás muito atrasada, d. Celina; os romances têm sempre uma<br />
verda<strong>de</strong> por base. O maior trabalho dos romancistas consiste em <strong>de</strong>sfigurar essa<br />
verda<strong>de</strong> <strong>de</strong> tal modo que os contemporâneos não cheguem a dar os verda<strong>de</strong>iros<br />
nomes <strong>de</strong> batismo às personagens que aí figuram.<br />
– Pelo que ouço, d. Mariquinhas, tu já escreveste!<br />
– Não, mas conversei já com um moço que escreve. Vamos porém ao nosso<br />
caso; <strong>de</strong>ixa ver o teu romance.<br />
– A minha história, tornou Celina, que abrindo a gaveta da mesa tirou<br />
algumas folhas <strong>de</strong> papel, e entregou-as com mão trêmula a Mariquinhas.<br />
153