OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
apenas <strong>de</strong>zenove anos, enten<strong>de</strong>s que já não posso respon<strong>de</strong>r senão pelo passado?<br />
– Pois bem, d. Mariquinhas, tu amas?<br />
– Vamos mal: eu vim para perguntar, e não para respon<strong>de</strong>r.<br />
– Mas tu amas?<br />
– Desconfio que sim.<br />
– Pois somente <strong>de</strong>sconfias?<br />
– És muito simples, d. Celina.<br />
– Por quê?<br />
– Porque ainda não sabes que entre nós, as moças, <strong>de</strong>sconfiar, neste assunto, é<br />
saber <strong>de</strong> certo.<br />
– Ah!...<br />
– E tu?<br />
– Eu?... então se tu amas <strong>de</strong>ves ter sofrido muito.<br />
– Sim... sim... sempre se sofre mais ou menos; e tu?...<br />
– Eu também.<br />
– Conta-me isso.<br />
– Não se po<strong>de</strong> contar o que eu sofro.<br />
– Mas por quê?<br />
– Parece que não é nada, e é muito: é uma dor... um <strong>de</strong>sassossego... um abalo<br />
interno que se não po<strong>de</strong> explicar.<br />
– Pois basta que me contes a história do teu amor; farei idéia <strong>de</strong> tuas penas<br />
pelas minhas.<br />
– Eu penso que amo...<br />
– Sim... compreendo... <strong>de</strong>sconfias que amas.<br />
– Mas olha, d. Mariquinhas, eu não amei por minha vonta<strong>de</strong>... foi sem sentir...<br />
– Sim... suce<strong>de</strong> a todas nós isso mesmo.<br />
– Foi pouco a pouco que esse sentimento entrou no meu coração... eu não<br />
<strong>de</strong>sconfiava disso, aliás saberia combatê-lo...<br />
– Debal<strong>de</strong>!<br />
– Quando me veio ao pensamento que eu po<strong>de</strong>ria estar amando... quando caí<br />
em mim, oh!... tudo foi em vão... era já muito tar<strong>de</strong>.<br />
– Tal qual suce<strong>de</strong>u comigo.<br />
– Chorei muito, d. Mariquinhas, chorei muito... uma noite inteira... e tu?<br />
– Eu?<br />
– Sim; tu choraste também muito?<br />
– Eu não, d. Celina.<br />
– Mas por quê?<br />
– Por duas razões; primeira, porque eu <strong>de</strong>sejava amar.<br />
– É possível?!<br />
– Eu fazia uma idéia muito engraçada do amor; há porém muitas moças que<br />
pensam como eu. Pensava que o amor era para uma moça o mesmo que a boneca<br />
para uma menina, um passatempo inocente, um brinquedo que se <strong>de</strong>ixa quando nos<br />
aborrece, e nada mais; por isso eu <strong>de</strong>sejava amar.<br />
150