18.04.2013 Views

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

– Eu...<br />

Os dois disputantes ficaram <strong>de</strong>sesperados outra vez.<br />

– Eu vou... bus... car... o “co... ra... ção”!... exclamou Jacó.<br />

Helena respon<strong>de</strong>u-lhe com um insulto, e o escrivão, cambaleando e<br />

segurando-se pelas pare<strong>de</strong>s, dirigiu-se ao seu quarto.<br />

No entretanto, e para que Jacó não se <strong>de</strong>ixasse ficar no quarto, pois que tudo<br />

se podia esperar do estado <strong>de</strong> embriaguez em que se achava, João, instigando<br />

Helena, fazia com que a mulher injuriasse em alta voz a seu marido.<br />

Jacó apareceu <strong>de</strong> novo à porta da pequena saleta.<br />

João lançou um olhar cheio <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> dúvida e <strong>de</strong> esperança sobre<br />

aquele homem.<br />

O ex-escrivão vinha abraçado com uma caixa <strong>de</strong> jacarandá, que se mostrava<br />

sob a forma <strong>de</strong> um coração.<br />

Era <strong>de</strong> fato aquilo que ar<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong>sejava ver o antigo agente <strong>de</strong><br />

Salustiano: era o “coração” <strong>de</strong> Jacó.<br />

– Até que enfim! murmurou João por entre os <strong>de</strong>ntes.<br />

E ergueu-se para ir ajudar a Jacó, que vinha cambaleando.<br />

O ex-escrivão chegou finalmente à mesa, e indo <strong>de</strong>positar aí a caixa que<br />

trazia, <strong>de</strong>bruçou-se sobre ela olhando meio risonho, e ainda meio <strong>de</strong>sconfiado para<br />

João.<br />

– Vamos <strong>de</strong>cidir a questão, disse este.<br />

– É do ma.... ri... do, balbuciou Helena.<br />

Com um movimento <strong>de</strong> <strong>de</strong>sespero o ex-escrivão <strong>de</strong>sabotoou o seu infalível<br />

fraque roxo, abriu a camisa, e <strong>de</strong>ixando ver um peito vermelho e cabeludo, foi com a<br />

mão mal segura tirar um cordão preto, a que estava presa uma pequena chave.<br />

– Vejamos... vejamos... disse João todo <strong>de</strong>sejos e esperanças.<br />

Jacó trabalhou por muito tempo para introduzir a chavinha na fechadura;<br />

porém, conhecendo que o não podia fazer, sentou-se <strong>de</strong> novo risonho, e disse<br />

gaguejando:<br />

– Que... di... a... bo....não pos... so... pa... re... ce... me que... es.. .tou<br />

bê...ba...do<br />

– Dê-me a chave, que eu abro...<br />

O ex-escrivão soltou uma gargalhada, sacudiu a cabeça e tornou a enfiar o<br />

cordão no pescoço.<br />

Também não vale a pena per<strong>de</strong>r tanto tempo por isso, tornou João; acabemos<br />

o prazer <strong>de</strong>sta noite com um último copo <strong>de</strong> vinho.<br />

E encheu os copos. Jacó bebeu meta<strong>de</strong> e entornou sobre a mesa e sobre si<br />

mesmo a outra meta<strong>de</strong>.<br />

Helena não bebeu, porque já dormia a sono solto.<br />

O antigo agente <strong>de</strong> Salustiano <strong>de</strong>ixou cair a cabeça, e pareceu adormecido.<br />

Daí a pouco Jacó roncava como um en<strong>de</strong>moninhado.<br />

No fim <strong>de</strong> um quarto <strong>de</strong> hora João ergueu-se, observou cuidadoso os dois<br />

esposos; abriu a camisa do ex-escrivão, tirou-lhe o cordão do pescoço, e<br />

223

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!