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OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

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– Amas a “Bela Órfã”!...<br />

Cândido ocultou o semblante entre as mãos e a velha prosseguiu com voz<br />

animadora e doce:<br />

– Esse teu amor, tão cheio <strong>de</strong> angélica pureza, que nunca os lábios do amante<br />

tocaram a ponta dos brandos <strong>de</strong>dinhos da amada; tão inocente que apenas, e a pesar<br />

teu, na presença <strong>de</strong> Celina lho dizem teus olhos, e na ausência o sonho <strong>de</strong> tua<br />

imaginação, <strong>de</strong>ve ser agradável a Deus, que ama a pureza e a inocência.<br />

– Ah! minha mãe! murmurou o mancebo.<br />

– Ama, que és já, ou bem cedo serás amado. E tu e ela sereis talvez aos olhos<br />

<strong>de</strong> Deus como dois pombos que <strong>de</strong> longe se namoraram, e que, <strong>de</strong> asas abertas, com<br />

o pensamento no céu, e os olhos um no outro, esperam o aceno <strong>de</strong> um anjo para<br />

voar, a ajuntar-se num só ninho, seguros da ventura com a bênção divina.<br />

– Ah! minha mãe! repetiu o mancebo erguendo a cabeça e mostrando o rosto<br />

enrubescido pelo mais belo pejo, e talvez com alguns átomos <strong>de</strong> esperança.<br />

– E a passagem da vida que hoje ten<strong>de</strong>s, continuou Irias, para a vida que<br />

<strong>de</strong>veis não tar<strong>de</strong> viver, será como a poética transição da noite escura e duvidosa para<br />

o dia claro e fulgente, que um sol fulguroso abrilhanta, e zéfiros perfumados<br />

suavizam.<br />

– Oh! senhora, é que vós esqueceis sempre que eu sou um pobre, e que para o<br />

pobre não há esperança <strong>de</strong> felicida<strong>de</strong> tão suprema como essa que me mostrais!<br />

– Não, não, mancebo; tu mentes a ti próprio. Examina o teu coração, procura<br />

bem, e lá acharás a esperança cifrada em uma única palavra, que é o moto sagrado e<br />

sublime da alma do justo.<br />

– E essa palavra, essa esperança qual é?...<br />

Irias levantou o braço, e apontando para cima com seu <strong>de</strong>do indicador, gran<strong>de</strong><br />

e emagrecido, disse:<br />

– Deus.<br />

Sentiram nesse momento que alguém subia a escada do velho sótão, e logo<br />

após a velha escrava <strong>de</strong> Irias apareceu, e disse:<br />

– A família do sr. Anacleto.<br />

Cândido não pô<strong>de</strong> conter um grito <strong>de</strong> surpresa.<br />

<strong>CAPÍTULO</strong> XIII<br />

O VELHO<br />

MAS ANTES <strong>de</strong> acompanharmos os habitantes do “Céu cor-<strong>de</strong>-rosa” em sua<br />

visita ao “Purgatório-trigueiro”, justo é relatar uma cena ocorrida na mesma tar<strong>de</strong>, e<br />

talvez ao mesmo tempo em que sucedia a que acabamos <strong>de</strong> referir. Era a hora da<br />

sesta.<br />

Pouco mais ou menos como acontecera a Cândido, que viu mostrar-se além da<br />

porta do seu velho sótão uma cabeça branca e dois olhos ver<strong>de</strong>s, assim também<br />

Celina, que na hora da sesta se achava sentada junto do seu piano e começava a<br />

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