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OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

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– Por que, senhor...<br />

– Porque eu me lembro que minha mãe po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>sgraçada... porque talvez<br />

ela precise <strong>de</strong> um braço a que se arrime para fazer a perigosa viagem <strong>de</strong>ste mundo, e<br />

eu não a conheço, não lhe posso esten<strong>de</strong>r meu braço... enxugar-lhe as lágrimas... ou<br />

chorar com ela!<br />

– É assim!...<br />

– Quando, senhora, eu encontro por essas ruas uma pobre mulher doente...<br />

mendicante... exposta aos insultos da gente <strong>de</strong>smoralizada... sendo talvez o objeto<br />

do <strong>de</strong>sprezo <strong>de</strong> muitos... quando <strong>de</strong> noite, aproveitando as trevas, eu vejo passar<br />

junto <strong>de</strong> mim uma mulher envolta, como a senhora, em negra mantilha, esten<strong>de</strong>ndo,<br />

vergonhosa, uma mão emagrecida e trêmula para receber a mais chorada esmola... e<br />

eu me lembro que tenho no mundo uma mãe, que é por força uma mulher, que não é<br />

impossível que seja uma <strong>de</strong>ssas que eu encontro. Senhora!... eu não sei nesses<br />

momentos o que <strong>de</strong>sejo... eu toco quase ao <strong>de</strong>sespero... <strong>de</strong>sejo morrer... e não me<br />

mato somente porque sou cristão.<br />

Ficaram ambos em silêncio por alguns instantes; ambos chorando, até que<br />

Cândido levantou a cabeça, e enxugando as lágrimas, disse:<br />

– Desculpe-me, era a senhora quem <strong>de</strong>via falar, e eu a tenho ocupado falandolhe<br />

<strong>de</strong> mim. Eu escuto.<br />

– Não, respon<strong>de</strong>u a <strong>de</strong>sconhecida; eu precisava ouvi-lo para animar-me.<br />

– Pois bem; agora cabe-lhe dizer em que lhe posso ser útil.<br />

– Senhor, disse a <strong>de</strong>sconhecida, o amor <strong>de</strong> sua mãe é o único que existe em<br />

seu coração?...<br />

– O único, não; eu amo a minha mãe adotiva; <strong>de</strong>vo gratidão a algumas<br />

pessoas; e mesmo... amo mais alguém.<br />

– Mas qual <strong>de</strong> todos esses amores será o maior, o mais po<strong>de</strong>roso?<br />

O mancebo hesitou; mas <strong>de</strong>pois respon<strong>de</strong>u com força:<br />

– O <strong>de</strong> minha mãe.<br />

– Seria capaz <strong>de</strong> sacrificar-se por esse?...<br />

– Tudo.<br />

– E se alguém lhe viesse pedir um obséquio tão gran<strong>de</strong> que importasse um<br />

sacrifício, pelo menos temporário, e lho pedisse em nome <strong>de</strong> sua mãe?...<br />

– Senhora...<br />

– Se esse serviço que lhe viessem pedir, não o pu<strong>de</strong>sse o senhor fazer sem<br />

ferir-se no coração, sem sentir doer-lhe a corda mais sensível <strong>de</strong>le; mas se, apesar<br />

disso, lho pedissem em nome <strong>de</strong> sua mãe...<br />

– Eu não compreendo...<br />

– Mas se no cumprimento <strong>de</strong> tal favor estivesse a salvação <strong>de</strong> uma mulher,<br />

que tem talvez ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser sua mãe...<br />

– Senhora! fale...<br />

– Oh! é o senhor quem <strong>de</strong>ve falar agora: o que faria?<br />

– Eu não sei <strong>de</strong> que se trata.<br />

– É um favor imenso, que lhe venho pedir em nome <strong>de</strong> sua mãe...<br />

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