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OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

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A velha tinha já outra vez se mergulhado em suas orações.<br />

Nesse momento aproximaram-se do túmulo um velho e duas senhoras; uma<br />

muito mais moça que se quis logo lançar <strong>de</strong> joelhos, e outra também moça ainda,<br />

que fez a primeira parar à força enquanto se não levantavam a velha e o mancebo.<br />

Teve então lugar uma cena que atraiu a atenção <strong>de</strong> quase todos os<br />

circunstantes.<br />

A primeira das recém-chegadas, que era tão jovem como bela, sustida à força<br />

por sua companheira, por entre um dilúvio <strong>de</strong> lágrimas, sufocada por seus soluços,<br />

encarava ainda assim com indizível mostra <strong>de</strong> gratidão a mulher e o mancebo que<br />

rezavam junto daquele túmulo.<br />

E o velho pálido, com os braços cruzados e a cabeça caída, chorava muito,<br />

como chora um pai pelo filho amado que lhe morreu.<br />

Finalmente a velha persignou-se e se ergueu. Um lugar ficou vazio; o moço<br />

levantava-se também por sua vez, quando a jovem escapando-se das mãos da<br />

senhora que a sustinha, foi... atirou-se <strong>de</strong> joelhos ao pé da urna funérea, exclamando:<br />

– Meu pai!... minha mãe!...<br />

O mancebo, que acabava <strong>de</strong> levantar-se, escutando aquela exclamação<br />

dolorosa, e olhando para a pessoa que a soltava, começou por seu turno a soluçar<br />

<strong>de</strong>sabridamente, e, sem querer talvez, pôs as mãos ainda em pé, e <strong>de</strong>pois foi pouco a<br />

pouco curvando-se até ajoelhar-se <strong>de</strong> novo.<br />

No entanto a comoção ou o acaso tinha feito com que se soltasse a mantilha<br />

que a velha trajava; e então aquela mulher alta, magra, com seus longos cabelos cor<br />

<strong>de</strong> neve caídos sobre uma saia <strong>de</strong> sarja preta, com as mãos postas e em pé por <strong>de</strong>trás<br />

daqueles dois jovens, completava um quadro da mais dolorosa eloqüência.<br />

Conhecendo que também ela se fazia objeto da geral atenção, apontou para o<br />

túmulo, olhou com seus olhos ver<strong>de</strong>s para a multidão e disse:<br />

– É o prêmio do justo.<br />

E <strong>de</strong>sfazendo-se em lágrimas, a velha envolveu-se <strong>de</strong> novo e ru<strong>de</strong>mente com<br />

sua mantilha, e retirou-se apressada.<br />

A esse tempo também o mancebo tinha já refletido sobre o que acabara <strong>de</strong><br />

praticar, e espantado <strong>de</strong> si mesmo, aproveitou o instante em que todos os olhos<br />

acompanhavam a velha, para <strong>de</strong>saparecer por entre os túmulos.<br />

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À inteligência <strong>de</strong> ninguém será feita a injustiça <strong>de</strong> dizer-se, como revelando<br />

um segredo, que essa mulher era Irias, e esse mancebo Cândido.<br />

Somente convém acompanhá-los em sua volta para o “Purgatório-trigueiro”.<br />

<strong>CAPÍTULO</strong> V<br />

O INSULTO<br />

A VELHA e o mancebo encontraram-se à porta do templo, e sem se dizerem<br />

palavra, dirigiram-se para o “Purgatório-trigueiro”.<br />

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