18.04.2013 Views

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>de</strong> minha vida, um pirilampo só que me dê alguma luz para que eu vá terrível e<br />

audaz arrasar esse mistério <strong>de</strong> meu berço. Sim! eu iria... pois que ninguém po<strong>de</strong> ter<br />

o direito <strong>de</strong> separar-me <strong>de</strong> minha mãe, e ela não há <strong>de</strong> nunca envergonhar-se <strong>de</strong> seu<br />

filho! oh! mas tudo é em vão. Há longos anos que eu não penso, que eu não cogito<br />

<strong>de</strong> outra coisa. Quando vou à igreja, quando rezo <strong>de</strong> joelhos, pensais, senhora, que<br />

eu peço a Deus honras e fortuna para mim neste mundo e a salvação <strong>de</strong> minha alma<br />

no outro?... não, mil vezes não. O pensamento, o objeto <strong>de</strong> minhas orações, é<br />

sempre um e único; o que eu peço a Deus é ela, sempre e só ela... é minha mãe.<br />

E dizendo isso, o mancebo prosseguiu com voz comovida e terna:<br />

– Porque se eu achasse minha mãe, queimaria, se eu fosse rico, toda minha<br />

riqueza para poupar-lhe um <strong>de</strong>sgosto... e ainda mesmo quando tivesse uma dor<br />

imensa no coração, havia <strong>de</strong> rir-me para não vê-la chorar e daria a minha vida para<br />

não <strong>de</strong>ixá-la morrer. Minha mãe, senhora, minha mãe! eu não quero nem esposa,<br />

nem filho, nem riqueza, nem glória; eu prefiro a tudo minha mãe!<br />

E cruzando as mãos sobre o peito, Cândido terminou dizendo com acento<br />

profundamente religioso:<br />

– Deus me ouça!<br />

– Tens razão, meu filho, disse enfim Irias, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> alguns instantes.<br />

– Portanto, senhora, reconheceis que, embora involuntariamente, zombastes<br />

<strong>de</strong> mim ainda há pouco?...<br />

– Não, Cândido.<br />

– Como não, senhora?...<br />

– Porque nesta vida <strong>de</strong>ve o homem, quando não po<strong>de</strong> conseguir o que mais<br />

<strong>de</strong>seja, consolar-se com algum <strong>de</strong>sses outros mil benefícios e favores, que Deus<br />

espalhou com profusa mão sobre o gênero humano.<br />

– Quereis explicar-vos, senhora?...<br />

– Não é só uma mãe a mulher que se ama extremosamente na vida.<br />

– E então?...<br />

– Ama-se a escolhida do coração... ama-se a esposa.<br />

– Que quereis dizer; senhora?... exclamou o mancebo estremecendo todo.<br />

– Quero perguntar-te se não concordas em que um moço, como tu és, triste,<br />

<strong>de</strong>svalido e pobre, po<strong>de</strong> achar consolação e fortuna na posse <strong>de</strong> uma mulher que<br />

ame?<br />

– Entendamo-nos, respon<strong>de</strong>u Cândido serenado. Um moço que for como eu,<br />

triste, <strong>de</strong>svalido e pobre, e que também tiver feito o mesmo juízo que eu faço a<br />

respeito da pureza e da dignida<strong>de</strong> do homem, po<strong>de</strong> sim achar consolação e uma<br />

fortuna toda moral na posse da mulher que ame e por quem for amado, mas não<br />

calcula nunca a sua fortuna positiva e material sobre esse dado.<br />

– Era pouco mais ou menos isso o que eu queria dizer.<br />

– E para concluir o quê?...<br />

– Que tu <strong>de</strong>ves amar...<br />

– Eu amar?! bradou o mancebo erguendo-se; eu amar?! e com que fim?...<br />

– Para ser menos <strong>de</strong>sgraçado.<br />

65

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!