18.04.2013 Views

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

– Infeliz! disse a “Bela Órfã” olhando com pieda<strong>de</strong> para a amiga que a<br />

escutava admirada.<br />

– Eu infeliz? por não chorar?<br />

– Oh! sim!... porque há certas lágrimas que dão um prazer que está acima <strong>de</strong><br />

todos os prazeres!<br />

– Então tu és bem ditosa?<br />

– Não.<br />

– Como, pois, esse prazer?<br />

– Ah! não me sacia nunca.<br />

– E então...<br />

– Eu sou como aquele que está <strong>de</strong>vorado por ar<strong>de</strong>nte febre: com fervor leva<br />

aos lábios um copo d’água... esgota-o... e <strong>de</strong> novo mata-o a se<strong>de</strong>. Amar é também<br />

uma febre... não é?<br />

– Eu já não digo palavra, respon<strong>de</strong>u Mariquinhas; estás mais adiantada do que<br />

eu.<br />

– É porque tu não amas.<br />

– Mas nota que tenho observado muito.<br />

– Engano! amor não se observa... sente-se!<br />

– Todavia tu és contraditória, d. Celina.<br />

– Como?<br />

– Começaste queixando-te <strong>de</strong> tuas lágrimas, e acabaste abençoando-as.<br />

– É porque nem todas são da mesma natureza. A imaginação, que não é nossa<br />

escrava, a imaginação, livre, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte como as aves da floresta virgem, se às<br />

vezes me oferece um quadro <strong>de</strong> esperança, <strong>de</strong> amor e <strong>de</strong> sauda<strong>de</strong>, outras vezes, d.<br />

Mariquinhas, cria fantasmas que atemorizam, fantasmas horríveis que bradam a<br />

meus ouvidos... que entoam o hino infernal, o hino do <strong>de</strong>sespero resumido em uma<br />

palavra fatal...<br />

– Qual?<br />

– Impossível!...<br />

O som com que a “Bela Órfã” pronunciou essa palavra foi tal, que tanto ela<br />

como Mariquinhas se <strong>de</strong>ixaram ficar caladas durante algum tempo, tristes e<br />

pensativas.<br />

No entanto serenou o ardor que fizera Celina exprimir-se com tanta viveza, <strong>de</strong><br />

modo que, quando Mariquinhas quis continuar a conversação, já a achou perturbada<br />

e comovida como no princípio.<br />

– Mas, d. Celina, ainda me não disseste o que eu <strong>de</strong>sejo principalmente saber.<br />

– O quê?<br />

– Quem é o venturoso mancebo que tanto merece <strong>de</strong> ti.<br />

A “Bela Órfã” hesitou.<br />

– Se eu não quisesse saber também tudo quanto se tem passado entre ele e ti,<br />

continuou Mariquinhas, abster-me-ia <strong>de</strong> fazer-te esta pergunta.<br />

– Por quê?<br />

– Porque não acho muita dificulda<strong>de</strong> em adivinhar o nome daquele que amas.<br />

152

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!