18.04.2013 Views

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

ligava.<br />

Amaram-se constantemente como seus pais; como seus pais casaram-se no<br />

mesmo dia. Um <strong>de</strong>les teve um fruto <strong>de</strong> seu himeneu; foi um belo menino que se<br />

chamou Leandro! foi o filho do rico.<br />

– Meu pai, murmurou Salustiano.<br />

– O outro teve dois filhos gêmeos e uma filha, que se chamavam João,<br />

Rodrigues e Emília. Fomos nós, sr. Salustiano.<br />

– Eu o sei.<br />

– Quando nossos pais morreram, bem cedo!... ficamos no mundo, her<strong>de</strong>iros<br />

<strong>de</strong>ssa amiza<strong>de</strong> pura e sagrada, que era a honra <strong>de</strong> nossas famílias e que fazia<br />

admiração das outras.<br />

Salustiano não disse nada.<br />

– Com orgulho, com a consciência cheia <strong>de</strong> prazer, <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>, e <strong>de</strong> sossego,<br />

nós dizíamos: – seremos como nossos pais! – oh! não <strong>de</strong>smentimos nunca!... fomos<br />

os <strong>de</strong>rra<strong>de</strong>iros, é certo... porque minha irmã morreu e meu irmão e eu não temos<br />

filhos; e porque o sr. Leandro teve um filho que se não parece com seus<br />

antepassados.<br />

– Senhor!<br />

– Silêncio, mancebo!... eu tenho o direito <strong>de</strong> te repreen<strong>de</strong>r! fui o irmão da<br />

alma <strong>de</strong> teu pai... sou um dos últimos her<strong>de</strong>iros da amiza<strong>de</strong> <strong>de</strong> cem anos!... Abaixa<br />

os olhos diante <strong>de</strong> mim, porque tu não serás nunca como foram os teus e os meus, e<br />

como somos ainda, meu irmão e eu. Silêncio, mancebo; quem fala aqui não é o<br />

pobre velho Rodrigues, é a voz da amiza<strong>de</strong> <strong>de</strong> cem anos.<br />

O moço, a pesar seu, abaixou a cabeça.<br />

O velho prosseguiu:<br />

– Sim... honra a nós; nós fomos como os nossos: Leandro, João e Rodrigues<br />

eram um só homem, e Emília, <strong>de</strong>z anos mais moça do que nós e seis do que<br />

Leandro, era a menina dos olhos <strong>de</strong> todos três, era o brilhante que se preparava para<br />

a coroa <strong>de</strong> alguém que fosse digno <strong>de</strong> ajuntar-se conosco. Emília era bela, pura,<br />

ingênua como um anjo, com seus olhos pretos, suas faces pálidas, e seu corpinho<br />

débil... pobre Emília!...<br />

O velho enxugou com a face dorsal da mão direita duas grossas lágrimas que<br />

estavam pen<strong>de</strong>ndo <strong>de</strong> suas pálpebras. Depois continuou:<br />

– Leandro apaixonou-se <strong>de</strong> uma jovem senhora, tão linda como vaidosa, tão<br />

rica como pouco nobre. Tar<strong>de</strong> conhecemos esses <strong>de</strong>feitos; aliás, o nosso amigo não<br />

teria sido esposo <strong>de</strong> Matil<strong>de</strong>.<br />

– Fala <strong>de</strong> minha mãe, senhor? disse Salustiano erguendo a cabeça.<br />

– Bem o sei, tornou o velho prosseguindo. Depois <strong>de</strong> casar-se, Leandro pediunos<br />

que consentíssemos que Emília fosse morar com sua mulher; nossa irmã tinha<br />

então <strong>de</strong>zesseis anos. Consentimos. Passaram os primeiros meses sem que<br />

suspeitássemos, sem que coisa alguma pudéssemos recear. Cedo, porém, começou<br />

Leandro a experimentar os excessos e efeitos <strong>de</strong> vaida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua mulher. Sua casa se<br />

tornou em um inferno; sua vida foi um martírio constante. O único lenitivo que<br />

214

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!