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OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

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traiçõezinhas, que fazem ao pudor <strong>de</strong> uma virgem os suspiros que por entre os lábios<br />

escapam, e os olhares que com mal comprimido fogo dar<strong>de</strong>jam os olhos; em que<br />

mar <strong>de</strong> inocência, <strong>de</strong> amor angélico, <strong>de</strong> candura e <strong>de</strong> graças se não banharia o<br />

pensamento do observador, penetrando no coração da virgem cristã?!<br />

Uma vida nova começa com o primeiro dia <strong>de</strong> amor. A aurora <strong>de</strong>sse dia rubra<br />

com o pejo da moça, revela um mistério que ainda se não compreendia a noite<br />

passada.<br />

De então por diante todos os pensamentos, todos os <strong>de</strong>sejos, os brilhantes<br />

arabescos da imaginação, os sonhos, que a alma sonha acordada, o futuro, os risos, o<br />

pranto e a vida da virgem estão presos por correntes <strong>de</strong> rosas ao mistério que se<br />

revelou.<br />

Foi o grito da natureza que soou, e que repercutiu no coração da donzela.<br />

Mas a virgem cristã teve a educação da pureza, e tem o pudor da mulher.<br />

Des<strong>de</strong> que concebeu a idéia do amor, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a sentiu, ouvindo o grito da<br />

natureza, corou <strong>de</strong> si mesma.<br />

Por que cora?... por que escon<strong>de</strong> um sentimento que a natureza inspira?... por<br />

que cora?... perguntai-lhe. Ela respon<strong>de</strong>rá com voz quase sumida – não sei, – há <strong>de</strong><br />

corar mil vezes mais, respon<strong>de</strong>ndo.<br />

E a virgem que não corasse por mais formosa que fosse, seria como uma flor<br />

sem perfumes, ou uma alma sem pensamentos.<br />

Mas a virgem preten<strong>de</strong> em vão escon<strong>de</strong>r o amor que amanheceu no seu<br />

coração. Ela o escon<strong>de</strong>, e ele se revela, como ainda o perfume que escapa da flor, e<br />

ainda o pensamento que transpira da alma.<br />

Observai a moça que começa a amar. Tudo é novo nela: uma revolução se<br />

operou em seu caráter e em suas ações; o seu físico mesmo se ressente; ela se torna<br />

mais encantadora.<br />

Estudai a expressão <strong>de</strong> seus olhos; seus olhares são vagos, rápidos, às vezes<br />

langorosos... é belo vê-la olhar assim...<br />

Melancólica e distraída, seus antigos prazeres a afadigam; esqueceu-se <strong>de</strong>les...<br />

tem na mente um <strong>de</strong>sejo novo...<br />

Louquinha que amava as festas com seu ruído e bulício; que corria pelos<br />

prados; que brincava com as companheiras saltando, gritando, zombando; agora se<br />

escon<strong>de</strong> em seu quarto para chorar sem motiva, e <strong>de</strong>pois, no jardim, fica uma hora<br />

parada <strong>de</strong>fronte <strong>de</strong> uma flor...<br />

Isso, e ainda muito mais que não será possível <strong>de</strong>screver completamente<br />

nunca, é a história da madrugada do amor, que todas as que foram moças gozaram, e<br />

que as que o não são <strong>de</strong>vem gozar ainda.<br />

Celina começava a experimentar todos esses fenômenos. A noite <strong>de</strong> seus anos<br />

rasgara, enfim, o véu da dúvida... No fim do canto do mancebo pobre ela havia<br />

compreendido que já o amava muito; que <strong>de</strong>ntro do seu coração esse amor brotara e<br />

crescera sem que fosse sentido... Cândido era amado.<br />

Mas por que se tinha ele retirado antes da terminação do baile? por que não<br />

aparecera <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então no “Céu cor-<strong>de</strong>-rosa”?<br />

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