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OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...

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constantemente com os olhos, anima-o com suas exortações, corrige-o com suas<br />

admoestações, dirige-o com seus conselhos, e enfim coroa-se também com os seus<br />

triunfos, e humilha-se com suas <strong>de</strong>rrotas, O <strong>de</strong>svario <strong>de</strong> seu filho o enlouquece; a<br />

mancha, que vem nodoá-lo, cai-lhe no coração; é com ele solidário na glória e na<br />

vergonha.<br />

Por seu filho tem um pai os olhos no mundo, e uma mãe os olhos no céu.<br />

E coisa notável!... a natureza inspira sentimentos que quase chegam a parecerse<br />

com a ingratidão.<br />

Um filho que <strong>de</strong>ve tanto a seus pais; que antes <strong>de</strong> nascer causou já tantas<br />

dores, tantos tormentos a sua mãe, que <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> nascer bebe o leite <strong>de</strong> seus peitos;<br />

um filho, por cuja causa per<strong>de</strong>ram seus pais tão longas noites, choraram lágrimas tão<br />

amargosas; um filho, ao pé do qual velam sempre por ele dois anjos, como duas<br />

Vestais pelo fogo sagrado; que tem sido o objeto <strong>de</strong> tão gran<strong>de</strong> amor, <strong>de</strong> tão<br />

extremosos cuidados; um filho tem na sua vida uma hora que lhe é marcada pela<br />

natureza; que é hora da natureza sim, mas que é hora também <strong>de</strong> ingratidão.<br />

Se esse filho é um homem, encontra cedo ou tar<strong>de</strong> uma mulher; e se é mulher,<br />

aparece-lhe um homem, pelo qual são <strong>de</strong>ixados pai e mãe!... basta às vezes o olhar<br />

<strong>de</strong> um mancebo elegante, para plantar-lhe no coração um sentimento que vai <strong>de</strong>pois<br />

na balança pesar mais que todos esses amores, que todos esses cuidados <strong>de</strong> vinte<br />

anos e <strong>de</strong> mais anos ainda!...<br />

A roda vai sempre girando. Os que foram filhos chegam um dia a ser pais, e<br />

enfim, vem também o tempo em que eles sentem por sua vez o que fizeram outrora<br />

experimentar a seus pais.<br />

Não sejam os homens acusados por isso... pois que todos seriam réus e<br />

ninguém po<strong>de</strong>ria ser juiz. Os homens não têm culpa; a natureza é que é a ingrata;<br />

mas o fato é esse.<br />

Solteiro, porém, ou casado, o filho continua sempre a ser o pensamento da<br />

alma <strong>de</strong> seus pais. É a luz que lhes brilha na vida. Quem foi que pô<strong>de</strong> já consolar<br />

aqueles que per<strong>de</strong>ram um filho?... o tempo?... o tempo dá somente resignação; muda<br />

o nome, crisma a dor; em vez <strong>de</strong> aflição, chama-a sauda<strong>de</strong>, mas os pais não<br />

esquecem o filho que lhes morreu senão quando morrem.<br />

Porém, nada po<strong>de</strong> ser eterno: tudo tem um fim. E esse amor <strong>de</strong>ve acabar um<br />

dia... acaba na sepultura.<br />

É esta a mais ligeira idéia que se po<strong>de</strong> dar, muito <strong>de</strong> passagem, do amor<br />

paternal.<br />

Se nem todos amam com a mesma força a seus filhos, amam-nos sempre e a<br />

natureza do afeto é a mesma.<br />

Anacleto amava a Mariana como os pais que são mais extremosos e ternos.<br />

Apenas saindo do berço, Mariana per<strong>de</strong>ra sua mãe, e então seu extremoso pai,<br />

vendo-a tão pequenina já órfã, tão <strong>de</strong>bilzinha e já sem um <strong>de</strong> seus gênios protetores,<br />

viu também nisso uma razão para amá-la em dobro.<br />

Obrigado por sua viuvez a ro<strong>de</strong>ar sua filha daqueles ternos e miúdos cuidados,<br />

<strong>de</strong> que especialmente se ocupam as mães, per<strong>de</strong>ndo noites por ela, às vezes<br />

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