OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
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– Guardar silêncio, respon<strong>de</strong>u este.<br />
– Silêncio?... e até quando?...<br />
– Eu lho direi. No entanto anime-se com a certeza <strong>de</strong> que tem amigos que<br />
velam por ele... pela senhora...<br />
E o velho acrescentou com voz insinuante:<br />
– E que velam sobretudo pelo seu amor.<br />
– Senhor...<br />
– É inútil fingir comigo... eu sei tudo.<br />
A moça cobriu o rosto com as mãos, envergonhada e sentida.<br />
E o velho <strong>de</strong>ixou a sala, cantarolando por entre os <strong>de</strong>ntes o romance “Sonho<br />
da Virgem”:<br />
“Era um dia um mancebo, que ar<strong>de</strong>nte...”<br />
<strong>CAPÍTULO</strong> XXV<br />
SÓ<br />
A SÚBITA e imprevista retirada <strong>de</strong> Cândido naquela fatal noite <strong>de</strong> anos, tinha<br />
sido um novo golpe para o coração do velho pai <strong>de</strong> Mariana.<br />
Anacleto vira sair da sala sua filha pelo braço do mancebo, apanhara um raio<br />
<strong>de</strong> cólera dar<strong>de</strong>jado contra ambos pelos olhos <strong>de</strong> Salustiano, e combinando estas<br />
observações com o <strong>de</strong>saparecimento <strong>de</strong> Cândido, parecia-lhe que sua filha, ce<strong>de</strong>ndo<br />
à inexplicável influência daquele, tinha uma parte qualquer no triste acontecimento.<br />
Muito ocupado com os <strong>de</strong>sgostos e temores que lhe causava Mariana, <strong>de</strong>ixou<br />
passar a noite e os dois dias que lhe seguiram, sem <strong>de</strong>safiar explicação alguma.<br />
Depois do primeiro serão, que teve lugar, passada a noite <strong>de</strong> anos, um novo<br />
pensamento encheu a alma daquele bom pai, que não teve mais tempo <strong>de</strong> lembrar-se<br />
<strong>de</strong> Cândido.<br />
Henrique viera pedir-lhe formalmente a mão <strong>de</strong> Mariana. O casamento ficara<br />
ajustado, e com geral assentimento <strong>de</strong>terminou-se que se efetuaria antes <strong>de</strong> um mês.<br />
Na noite do seguinte serão, Anacleto apresentou os noivos a seus amigos; e<br />
então lembrou-se outra vez que faltava na sala alguém a quem votava estima leal e<br />
bem merecida.<br />
No outro dia chamou Mariana a seu quarto, e interrogou-a seriamente sobre a<br />
ausência <strong>de</strong> Cândido.<br />
A viúva contava que mais cedo ou mais tar<strong>de</strong> se trataria disso no “Céu cor-<strong>de</strong>rosa”,<br />
e tinha-se preparado para não atraiçoar-se <strong>de</strong>ixando entrever a verda<strong>de</strong>.<br />
Respon<strong>de</strong>u a seu pai com segurança e calma. Ela não sabia nada que pu<strong>de</strong>sse<br />
ter relação com esse fato; sentia mesmo muito que um moço tão recomendável<br />
assim se tivesse retirado do “Céu cor-<strong>de</strong>-rosa”.<br />
O olhar penetrante e <strong>de</strong>sconfiado do velho esteve, durante toda a conferência,<br />
constantemente fito no rosto <strong>de</strong> Mariana, e não pô<strong>de</strong> apanhar o mais leve indício <strong>de</strong><br />
fingimento. A verda<strong>de</strong> estava fechada no coração da viúva com uma porta <strong>de</strong> ferro.<br />
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