OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
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Depois da volta <strong>de</strong> Henrique à pátria, acompanhava-o ao “Céu cor-<strong>de</strong>-rosa”, e<br />
observava...<br />
Os dois amigos estavam juntos na manhã que se seguia <strong>de</strong>pois da noite dos<br />
anos <strong>de</strong> Celina.<br />
Henrique achava-se pensativo e profundamente melancólico.<br />
– Previ que estimarias ver-me hoje cedo, disse Carlos.<br />
– Estimo ver-te sempre; que quer porém dizer a tua previsão?<br />
– Adivinhei que estarias pensativo e triste.<br />
– Então adivinhaste também o motivo?<br />
– Também.<br />
Henrique corou sem querer; ensaiou um sorriso, e perguntou:<br />
– E qual é?...<br />
– Sou teu médico, Henrique, e vi que a noite <strong>de</strong> ontem <strong>de</strong>veria fazer-te mal.<br />
– E fez-me.<br />
– Portanto, fiz bem em vir conversar contigo: necessáriamente tens muito que<br />
dizer-me.<br />
– Não; tenho ao contrário alguma coisa que perguntar.<br />
– Vamos, pois.<br />
– Que observaste ontem à noite, Carlos?<br />
– Provavelmente menos do que tu, Henrique.<br />
– Menos do que eu?...<br />
– Sim; porque eu examinei tudo com o olhar frio do observador, e tu viste<br />
tudo com os olhos enganadores da paixão.<br />
– E então?...<br />
– Então tu <strong>de</strong>ixaste ontem o “Céu cor-<strong>de</strong>-rosa” com a convicção terrível <strong>de</strong><br />
que tinhas um rival po<strong>de</strong>roso no jovem Salustiano.<br />
– E tu?...<br />
– E eu vim com a certeza <strong>de</strong> que a bela viúva <strong>de</strong>testa esse homem mais do que<br />
tu mesmo.<br />
– É possível?!<br />
– Mas eu trouxe também a certeza <strong>de</strong> que entre ela e Salustiano existe um<br />
segredo, que é uma barreira que se levanta contra o teu amor.<br />
– Oh!... mas esse fatal segredo...<br />
– É um segredo... não o saberás... não o saberemos.<br />
– Mas eu daria meu sangue... meta<strong>de</strong> <strong>de</strong> minha vida para po<strong>de</strong>r arrasá-lo.<br />
– E nunca o saberás.<br />
Henrique torceu as mãos com violência, e <strong>de</strong>pois exclamou com acento <strong>de</strong> dor<br />
profunda:<br />
– Que eu não possa esquecer essa mulher!<br />
E começou a passear por toda a extensão da sala visivelmente alterado.<br />
Carlos acompanhava-o em silêncio e com os braços cruzados, até que enfim<br />
Henrique principiou a <strong>de</strong>sabafar seus sofrimentos, falando.<br />
– É incrível! exclamou ele: como se po<strong>de</strong> explicar este sentimento que tem<br />
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