OS DOIS AMORES Joaquim Manuel de Macedo CAPÍTULO I O ...
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– Oh!<br />
– O interior do bosque era sombrio; fora soava a música terna e maviosa;<br />
<strong>de</strong>ntro exalavam-se embriagadores perfumes; mas... outra vez o bosque era<br />
sombrio... senhora! Leandro e Mariana per<strong>de</strong>ram-se no bosque.<br />
– Per<strong>de</strong>ram-se!... balbuciou dolorosamente a viúva.<br />
– Quando voltaram, para <strong>de</strong> novo tomar parte na festa, Mariana estava pálida,<br />
e Leandro mais que nunca apaixonado.<br />
– Ele sabe tudo! disse a pobre mulher.<br />
– No dia seguinte, prosseguiu o velho, Leandro foi visitar o pai <strong>de</strong> Mariana, e<br />
pediu-lhe a mão da bela moça; o casamento foi ajustado; <strong>de</strong>veria celebrar-se daí a<br />
um mês. No entretanto Leandro e Anacleto ligaram-se, como bons amigos.<br />
– Ah!... por bem pouco tempo!<br />
– É verda<strong>de</strong>; a intolerância política veio logo separá-los. Com efeito, o<br />
ministério da in<strong>de</strong>pendência, o gabinete Andrada acabava <strong>de</strong> cair; homens acusados<br />
<strong>de</strong> simpatia pelo antigo sistema subiram ao po<strong>de</strong>r; a população dividiu-se em dois<br />
campos inimigos, e a exaltação dominou em ambos. Anacleto extremava-se<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo as velhas idéias, Leandro representava as novas, que pouco antes<br />
haviam triunfado. Um dia o velho e o moço encontraram-se <strong>de</strong>fronte um do outro<br />
em completo antagonismo; o exaltamento <strong>de</strong> ambos inspirou-lhes palavras<br />
<strong>de</strong>sabridas, e o pai <strong>de</strong> Mariana, esten<strong>de</strong>ndo o braço, mostrou ao noivo <strong>de</strong> sua filha a<br />
porta por on<strong>de</strong> <strong>de</strong>via sair para não tornar nunca mais à sua casa; ficaram inimigos<br />
irreconciliáveis.<br />
– Oh! foi assim!<br />
– Anacleto or<strong>de</strong>nou a sua filha que esquecesse para sempre o feroz<br />
republicano; e a <strong>de</strong>sgraçada, que já não tinha o direito <strong>de</strong> esquecê-lo, não teve<br />
ânimo <strong>de</strong> cair aos pés <strong>de</strong> seu pai e <strong>de</strong> confessar-lhe que havia cometido um erro, e<br />
que sentia fortemente as conseqüências <strong>de</strong>sse erro. Mais ainda; Anacleto fez-se<br />
perseguidor <strong>de</strong> Leandro, que se viu obrigado a viver oculto durante alguns meses<br />
<strong>de</strong>ssa época tão calamitosa. No entretanto, senhora, tinham chegado do campo dois<br />
amigos <strong>de</strong> Leandro, dois amigos que não hesitaram em dar a vida por ele; o infeliz<br />
abriu-lhes o seu coração... contou-lhes tudo; e João e Rodrigues, os dois amigos,<br />
tomaram sobre seus ombros o encargo <strong>de</strong> observar Mariana, <strong>de</strong> velar por ela...<br />
Mariana levantou um pouco a cabeça.<br />
– Como lamentavas tu, mulher vaidosa, a <strong>de</strong>sgraça do homem que te<br />
amava?... como choravas tu, mulher imprevi<strong>de</strong>nte e louca, a tua própria <strong>de</strong>sgraça?...<br />
alegre e festiva, tu te embriagavas <strong>de</strong> novo com os prazeres da corte... os saraus... os<br />
passeios... a vida <strong>de</strong> loucuras continuava sempre!... parecias até esquecida <strong>de</strong> ti<br />
mesma. Ah! sim! mulher, a tua cabeça não se lembrava <strong>de</strong> teu seio.<br />
Mariana tornou a escon<strong>de</strong>r o rosto entre as mãos,<br />
– O teu viver exasperava o infeliz Leandro, que não podia estar a teu lado, e<br />
que, escondido, via-te apenas pelos olhos <strong>de</strong> seus dois amigos. Ele compreen<strong>de</strong>u que<br />
não serias nunca uma esposa extremosa e <strong>de</strong>votada em corpo e alma a seu marido; e<br />
todavia o pensamento único que o ocupava, a idéia que lhe roubava o sono, era a<br />
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