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lolita_vladimir_nabokov

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que eu abrira (que pena nenhuma película ter registado o<br />

curioso padrão, a monogrâmica articulação dos nossos<br />

gestos simultâneos ou sobrepostos). Rapidamente, quase<br />

nada embaraçada pela desfigurada maçã que segurava, Lo<br />

folheou violentamente a revista, à procura de qualquer coisa<br />

que desejava mostrar a Humbert. Encontrou-a, finalmente.<br />

Fingindo interesse, cheguei a cabeça tão para junto da sua<br />

que o seu cabelo me tocou na têmpora e o seu braço roçou<br />

pela minha face, quando limpou os lábios com o pulso.<br />

Devido à névoa brilhante através da qual olhei para a<br />

gravura, a minha reacção tardou e os joelhos de Lo roçaram<br />

e chocaram impacientemente um pelo outro e um contra o<br />

outro. Consegui, enfim, ver a imagem, ainda que de um<br />

modo vago: um pintor surrealista, suína e<br />

descontraidamente estendido numa praia, e perto dele,<br />

também em postura supina, uma réplica de gesso da Vénus<br />

de Milo, meio enterrada na areia. Fotografia da semana,,<br />

dizia a legenda. Afastei para longe a obscenidade. Acto<br />

contínuo, numa fingida tentativa para recuperar a revista, Lo<br />

atirou-se toda para cima de mim.<br />

Agarrei-lhe no pulso delgado e ossudo. A revista escorregou<br />

para o chão, como uma galinha de penas eriçadas. Lo<br />

libertou-se, com um puxão, afastou-se e recostou-se no<br />

canto direito do sofá. Depois, com absoluta simplicidade, a<br />

descarada garota atravessou as pernas no meu colo.<br />

57<br />

Nessa altura já me encontrava num estado de excitação<br />

vizinho da loucura - mas tinha também a astúcia dos loucos.<br />

Sentado no sofá, consegui harmonizar, com uma série de<br />

movimentos sorrateiros, a minha disfarçada luxúria com as<br />

suas pernas inocentes. Não foi fácil distrair a atenção da<br />

donzelinha enquanto executava os obscuros ajustamentos<br />

indispensáveis ao êxito do truque. Falando depressa,<br />

perdendo e recuperando o fôlego, fingindo uma súbita dor<br />

de dentes para explicar os intervalos na minha tagarelice -<br />

mas sem nunca desviar um olho interno, de maníaco, da

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