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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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aban<strong>do</strong>nou a sociedade portuguesa, explican<strong>do</strong> a marginalização violenta a que<br />

estão votadas as comunidades migrantes africanas. (Castro Henriques, 2004: 28)<br />

Como vemos, as ocorrências analisadas (os textos de Lefeuvre, Memmi, Smith,<br />

etc.), não enriquecem o Texto, não trazem novas imagens, limitam-se a retomar/repetir o<br />

dispositivo sempre já disponível; daí, sem dúvida, a sensação de monotonia na leitura de cada<br />

ocorrência, mas é esta retoma que contribui justamente para a força <strong>do</strong> Texto. O seu<br />

enraizamento na episteme ocidental, a sua repetição numa multiplicidade de suportes, a sua<br />

naturalização junto de um público alarga<strong>do</strong> explica em grande parte a sua permanência.<br />

Como qualquer outra ideologia, o Texto adapta-se às suas ocorrências e cada uma destas é<br />

ao mesmo tempo recetáculo e amplifica<strong>do</strong>ra de ideologia. Já em 1952, Fanon verificava a<br />

dificuldade de combater a representação desvalorizante <strong>do</strong> negro, mesmo quan<strong>do</strong> se<br />

utilizava a arma da razão. Explicava o fracasso da tentativa por causa justamente <strong>do</strong> poder<br />

da representação <strong>do</strong>(s) Outro(s), reduzi<strong>do</strong>(s) a um cenário numa História contada por e<br />

para o Mesmo europeu, ou a uma narrativa da qual aquele não é o sujeito nem o autor: «Il y<br />

aura toujours un monde – blanc – entre vous et nous… Cette impossibilité pour l’autre [ou<br />

seja o Branco] de liquider une fois pour toutes le passé» (Fanon, 1952: 98).<br />

Mais recentemente, num ensaio sobre as origens da inferiorização <strong>do</strong> Negro,<br />

Catherine Coquery-Vidrovitch reconhecia a dificuldade em desfazer as imagens <strong>do</strong> Outro<br />

que contribuíram para a sua representação:<br />

Ces préjugés eurocentrés qui présentent des Noirs ou des Jaunes une image<br />

dépréciée demeurent partout en filigrane. […] Le savoir tout récent de quelques<br />

africanistes de bonne volonté est encore impuissant à contrer cet énorme héritage<br />

que l’on peut qualifier aujourd’hui d’abominable, car il n’a plus pour le justifier ou<br />

du moins l’expliquer et le comprendre le contexte économique et scientifique<br />

dépassé du siècle <strong>colonial</strong>. Il relève de préjugés banals et, en définitive, de<br />

l’ignorance. (Coquery-Vidrovitch, 2006: 915-917)<br />

Ao contrário de Coquery-Vidrovitch, não creio que se trate apenas de «preconceitos<br />

banais» e de «ignorância» – parece-me difícil falar de ignorância <strong>do</strong> <strong>colonial</strong>ismo no caso de<br />

Lefeuvre ou de Memmi –, mas também da impregnação no ser europeu <strong>do</strong> racismo <strong>colonial</strong>,<br />

um racismo incorpora<strong>do</strong>, exerci<strong>do</strong> e experimenta<strong>do</strong> em cada gesto e fala <strong>do</strong> dia-a-dia. O<br />

primeiro Memmi (1957) não se tinha engana<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> o descrevia da seguinte maneira:<br />

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