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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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Em 2007, a mesma pergunta, «Como explicar o inexplicável?», motivava os<br />

jornalistas na busca das origens da desgraça (Vandendries, Jean et al., 2007: 2-3), pois aqui,<br />

como no primeiro caso, <strong>do</strong>s vizinhos ao Presidente da Câmara, passan<strong>do</strong> pelo pai, ninguém<br />

entendia o que levara Geneviève Lhermitte a esfaquear os seus filhos. Aqui também os<br />

jornalistas transformam as pessoas em atores de um drama, o pai, pouco presente, sem<br />

fonte de rendimento claramente definida, e a mãe, descrita como «prévenante, attentionnée,<br />

souriante, de bonne humeur, polie, elle aimait ses enfants», de maneira a realçar o carácter<br />

inexplicável <strong>do</strong> ato. A verdade judiciária aparece mais uma vez como incontornável quan<strong>do</strong><br />

se trata de procurar as motivações de um gesto criminoso: neste caso, resume-se ao esta<strong>do</strong><br />

depressivo da autora. Por fim, seguem-se as opiniões de especialistas universitários<br />

entrevista<strong>do</strong>s.<br />

Na transformação em narrativa <strong>do</strong> ato trágico, a procura das razões é<br />

manifestamente essencial, pois nas perguntas colocadas a <strong>do</strong>is professores, um psicólogo e<br />

um filósofo, é patente o desejo de encontrar as causas que permitirão construir uma<br />

narrativa completa, uma narrativa que integre a desgraça e as explicações para a desgraça.<br />

Só que os jornalistas não contavam aparentemente com a possibilidade da impossibilidade<br />

de responder à pergunta inicial. Assim, perante a pergunta se a «desumanização da<br />

sociedade» poderia ser a chave, o psicólogo responde: «[…] Tenho a sensação que o nosso<br />

mo<strong>do</strong> de vida, a perda de valores, etc. são explicações um pouco ligeiras para compreender<br />

aqueles esta<strong>do</strong>s agu<strong>do</strong>s de desespero ilimita<strong>do</strong>, que são concomitantes de atos tão terríveis<br />

como matar os seus próprios filhos […] » (Vandendries, 2007: 2-3). Alguns dias mais tarde,<br />

o mesmo jornal continuava a tentar entender esta «situação trágica», desta vez, com a ajuda<br />

de E<strong>do</strong>uard Delruelle, filósofo especializa<strong>do</strong> em filosofia moral e filosofia <strong>do</strong> direito. Como<br />

se vê, <strong>do</strong> seu ponto de vista, também existe a possibilidade da impossibilidade da<br />

causalidade clara:<br />

Par définition, je dirais que seul l’humain est capable d’être... inhumain. Dans<br />

chaque humain, il y a une part d’obscur, de noir, d’inhumain. Un tel fait divers fait<br />

que nous sommes pris d’effroi. Parce que cela nous renvoie à nous-mêmes. Cela<br />

segunda filha, não quis ter mais filhos. Também não queria mais pedir conselhos a um médico'. Dominique<br />

Cottrez deu este único motivo como explicação para a morte de oito <strong>do</strong>s seus filhos» (« ‘Mijn eerste bevalling<br />

was zo zwaar dat ik na mijn tweede <strong>do</strong>chter geen kinderen meer wilde. Ik wou ook nooit meer een <strong>do</strong>kter<br />

raadplegen’. Dat eenvoudige motief gaf Dominique Cottrez als verklaring voor de <strong>do</strong>od van acht van haar<br />

baby’s.» ) in Pieter Huyberechts (2010), «Ik wilde geen kinderen meer», De Standaard, Sexta-feira, 30 de Julho<br />

(4-5).<br />

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