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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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literatura. Parece-me que essa articulação emerge em Quayson (2000) no seu ensaio sobre<br />

as semelhanças e diferenças entre o pós-modernismo e o pós-<strong>colonial</strong>. Depois de uma<br />

primeira parte mais teórica onde questiona ambos os conceitos, o autor analisa algumas<br />

representações pós-coloniais e pós-modernas, ou melhor, tenta mostrar em que medida<br />

certas representações podem ser descritas como pós-coloniais e outras como pós-<br />

modernas. 30 Para mostrar que as representações pós-coloniais são marcadas pelo cunho da<br />

«<strong>do</strong>uble consciousness», teorizada entre outros por Du Bois, opta por uma comparação<br />

entre uma peça de Kobina Sekyi (Ghana) e um romance de Toni Morrison em nome de<br />

uma semelhante experiência de violência e relegação por parte <strong>do</strong>s negros de ambos os<br />

la<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Atlântico. A diferença em relação aos ensaios cita<strong>do</strong>s acima tem a ver com a<br />

consciência <strong>do</strong> efeito produzi<strong>do</strong> pelo trabalho de comparação entre ambos os escritores:<br />

The purpose of this would in my view be […] to force the phenomenon under<br />

analysis into a mode of alienation or estrangement from itself by means of which it<br />

would be made to deliver a truth-value that ramifies far beyond its own <strong>do</strong>main of<br />

circulation. (Quayson, 2000: 106)<br />

E, um pouco mais à frente, acrescenta:<br />

The point of it was to estrange the two texts from their normal grids of<br />

interpretation and to show how a similarity of effects could be said to have<br />

impinged upon the formation of subjectivity in both contexts. (Quayson, 2000:<br />

107)<br />

É neste ponto que vejo uma articulação com a ciência comparativa da literatura,<br />

pois esta propõe também deslocar os textos, pô-los a circular fora <strong>do</strong> seu campo literário<br />

original, ou seja, fora não só <strong>do</strong>s seus circuitos de leitores mas também fora das leituras<br />

críticas próprias a um determina<strong>do</strong> campo. Para dizê-lo noutras palavras, não se trata só de<br />

ler o que se escreve <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> da fronteira, mas igualmente de ver como se lê <strong>do</strong> outro<br />

la<strong>do</strong> da fronteira. O efeito desta deslocação pode de facto suscitar alguma estranheza em<br />

torno <strong>do</strong>s textos em análise. No trabalho de comparação, porque se trata necessariamente<br />

de um olhar distante, algo surge <strong>do</strong>s textos que uma análise nacional, ou local, para<br />

30 Entre os críticos, Quayson tem si<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s raros a dedicar alguma atenção às representações fílmicas e<br />

televisivas como sen<strong>do</strong> veículos <strong>do</strong> pós-modernismo e <strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong>ismo. Neste artigo faz uma leitura pósmoderna<br />

(como a série relativiza a racionalidade científica) e pós-<strong>colonial</strong> (a maneira de representar o Outro<br />

na série) de um episódio da série de ficção científica X-files. Ter-se-á nota<strong>do</strong> que o simples facto de se<br />

interessar por uma série é em si uma postura inova<strong>do</strong>ra no campo das ciências humanas. Mais uma vez, a<br />

perspetiva pós-<strong>colonial</strong> põe as «fronteiras» a mexer. O que provavelmente uma certa academia não<br />

consideraria cultura, ou digno de interesse, é aqui objeto de uma análise rigorosa.<br />

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