24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

1975 a partir de Lisboa, devi<strong>do</strong> ao contexto interno, regional e internacional em que se<br />

inseriu a independência de Angola (Birmingham, 2002: 137-184; Chabal, 2002: 73-74).<br />

Ao hermeneuta <strong>do</strong> texto literário colocam-se de imediato <strong>do</strong>is problemas; o<br />

primeiro tem a ver com a metalinguagem ao seu dispor. Para descrever o fenómeno em<br />

questão, coloquei como hipótese de partida a possibilidade de recorrer ao conceito de<br />

«Poscolónia», como foi descrito por Mbembe. Só que, como mostrarei mais à frente, a<br />

«Poscolónia», longe de resolver o problema da denominação, torna-o ainda mais complexo,<br />

pois, por um la<strong>do</strong>, remete unicamente para os países ex-coloniza<strong>do</strong>s e impede, por<br />

conseguinte, a sua utilização para designar os Esta<strong>do</strong>s ex-coloniza<strong>do</strong>res, dan<strong>do</strong> assim a<br />

entender que estes não continuam, de maneira óbvia ou latente, marca<strong>do</strong>s pela experiência<br />

<strong>colonial</strong>. Por outro la<strong>do</strong>, reduz o perío<strong>do</strong> que se seguiu às independências a um prefixo e<br />

faz <strong>do</strong>s jovens Esta<strong>do</strong>s uma simples continuação da colónia.<br />

O segun<strong>do</strong> problema é de ordem epistemológica ou ainda de representação. Como<br />

Said mostrou para o Oriente e Mudimbe para a África negra, existe entre o sujeito e o seu<br />

objeto de estu<strong>do</strong> um vasto Texto sempre já presente, um conjunto de representações<br />

ideologicamente marcadas ou orientadas, que o intelectual palestiniano chamava de<br />

orientalismo (Said, 1978) e o intelectual congolês de gnose (Mudimbe, 1988). 73 Ambos<br />

mapearam e descreveram as genealogias <strong>do</strong> Orientalismo e da Gnose, o seu contexto<br />

epistemológico, as suas características discursivas e o seu conteú<strong>do</strong> temático. Ambos se<br />

apresentam como incontornáveis para quem estuda as representações de um certo Sul<br />

enraizadas num certo Norte.<br />

O que aqui me interessa particularmente é a existência de um Texto de cariz e<br />

conteú<strong>do</strong> <strong>colonial</strong> que tem si<strong>do</strong> escrito depois das independências e que visa explicitar as<br />

razões <strong>do</strong> suposto fracasso <strong>do</strong>s novos Esta<strong>do</strong>s. Escolhi textos de Béji, Smith e Memmi,<br />

entre muitos outros possíveis, porque, por um la<strong>do</strong>, se trata de autores com apreciável<br />

capital simbólico e, por outro la<strong>do</strong>, pelo facto de os seus ensaios serem emblemáticos<br />

relativamente a muitos <strong>do</strong>s preconceitos e estereótipos presentes num certo senso comum.<br />

A matriz é claramente <strong>colonial</strong>, mesmo quan<strong>do</strong> se trata de textos contemporâneos, porque<br />

retomam, naturalizan<strong>do</strong>-a, a conceção <strong>colonial</strong> <strong>do</strong>(s) Outro(s), com uma nuance porém: o<br />

73 Não será assim tão surpreendente o facto de muitos especialistas das Áfricas abrirem os seus textos com<br />

uma reflexão relativa à representação. Philippe Hugon, por exemplo, dedica as primeiras páginas da sua<br />

Géopolitique de l’Afrique (2006) a uma análise da representação <strong>do</strong> continente. Mesmo se for difícil desfazer-se<br />

da carga ideológica que acompanha os discursos ocidentais nesta matéria, é por aqui que é preciso começar:<br />

«la géopolitique de l’Afrique commence par des jeux de représentation et de dénomination mais également de<br />

conceptualisation» (Hugon, 2006: 7).<br />

76

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!