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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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normais entre angolanos, para nós a família é tu<strong>do</strong> e deve estar sempre unida, as outras<br />

famílias são assim, por que não a nossa?» (Pepetela, 2005: 238) 283<br />

Como sugeria há pouco, a queda de um pequeno potenta<strong>do</strong> como Caposso aponta<br />

para o possível fim da circularidade trágica para algumas personagens (não para todas,<br />

como o mostra o caso de Simão Kapiangala), pois Sebastião Lopes, Bernardino<br />

Chipengula, mas também os percursos de Nacib e de Kasseke apontam para a existência de<br />

outras vias nas representações <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong>.<br />

Creio que algo de fundamental relativamente à origem <strong>do</strong> mal se revela na<br />

representação antagónica de Caposso (personagem principal) como fonte <strong>do</strong> mal que<br />

assola várias personagens e de Lopes, Chipengula e Nacib (personagens secundárias) como<br />

possibilidades <strong>do</strong> bem. Com esta polarização mal/bem, Pepetela cruza-se com o<br />

pensamento de Terestchenko num texto que lhe é exatamente contemporâneo. Como<br />

vimos no capítulo dedica<strong>do</strong> ao trágico, este opõe ao paradigma egoísta, segun<strong>do</strong> o qual o<br />

ser humano só seria movi<strong>do</strong> pelo próprio interesse, o paradigma altruísta, que defende a<br />

existência no ser humano, independentemente <strong>do</strong> contexto, de uma tendência para se<br />

envolver em prol de outrem sem esperar qualquer retribuição:<br />

…par une puissante autonomie personnelle, la capacité à agir en accord avec ses<br />

propres principes indépendamment des valeurs sociales en vigueur et de tout désir<br />

de reconnaissance. (Terestchenko, 2005: 16)<br />

Notava Terestchenko que não se tratava de um altruísmo defini<strong>do</strong> em função de<br />

uma crença, que se aparentaria, nesse caso,a um sacrifício religioso, mas de um altruísmo<br />

…comme relation bienveillante envers autrui qui résulte de la présence à soi, de la<br />

fidélité à soi, de l’obligation, éprouvée au plus intime de soi, d’accorder ses actes avec<br />

ses convictions (philosophiques, éthiques ou religieuses) en même temps qu’avec<br />

ses sentiments (d’empathie ou de compassion) […]. (Terestchenko, 2005 : 17)<br />

A partir de uma leitura de Francis Hutcheon, filósofo escocês <strong>do</strong> século XVIII,<br />

Terestchenko explica ainda a preponderância <strong>do</strong> paradigma altruísta sobre o seu oposto<br />

devi<strong>do</strong> aos sentimentos suscita<strong>do</strong>s em muitos seres humanos pelo espetáculo <strong>do</strong><br />

sofrimento alheio: a compaixão e a piedade. Trata-se de <strong>do</strong>is sentimentos, diz ainda<br />

283 O esta<strong>do</strong> da casa de Vladimiro Caposso parece também anunciar a sua queda iminente, pois a reprodução<br />

da Torre Eiffel no jardim <strong>do</strong>s Caposso evidencia «algumas fissuras na madeira» e a pintura a desaparecer<br />

(Pepetela, 2005: 304).<br />

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