24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

CAPÍTULO V - O TRÁGICO DO ESTADO PÓS-COLONIAL<br />

V.1. TRAGÉDIA E TRÁGICO NO SUL<br />

Como tentei mostrar em vários momentos, ler numa perspetiva comparada significa<br />

ler não só o que se escreve <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> da «fronteira» mas também como se interpreta o<br />

bem simbólico daquele outro la<strong>do</strong>. Este dupla deslocalização, a <strong>do</strong> objeto de estu<strong>do</strong> e a da<br />

maneira de o ver, acompanha grande parte da crítica pós-<strong>colonial</strong>, ou seja, o crítico efetua<br />

neste contexto uma paralaxe – palavra cuja origem etimológica remete utilmente para, mais<br />

uma vez, a ideia de movimento – para, à semelhança <strong>do</strong> que acontece com o sujeito em<br />

geral, conseguir uma nova perspetiva sobre o objeto. Esta tensão que nos conduz a uma<br />

leitura fronteiriça da tragédia e <strong>do</strong> trágico no Sul não significa a renúncia a um sistema<br />

crítico, ti<strong>do</strong> como inadapta<strong>do</strong> ou não pertinente, em prol de outro, considera<strong>do</strong> mais apto à<br />

interpretação <strong>do</strong> objeto. Não se trata assim de rejeitar instrumentos críticos oriun<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />

Norte por estes não serem úteis para uma interpretação de textos <strong>do</strong> Sul, mas de questionar<br />

a sua pertinência, os seus limites, quan<strong>do</strong> confronta<strong>do</strong>s com as alteridades textuais <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong>. Por outras palavras, o crítico não deveria importar as diferentes aceções <strong>do</strong> trágico<br />

na sua deslocação para o sul para confirmar uma grelha de leitura, mas, a partir de textos<br />

que se definem claramente como tragédias, interrogar os limites desta. Contu<strong>do</strong>, os bens<br />

simbólicos que foram produzi<strong>do</strong>s <strong>do</strong> outro la<strong>do</strong> da fronteira não representam a alteridade<br />

absoluta – se fossem, só restaria o silêncio para o crítico – pois inserem-se em categorias<br />

reconhecíveis, os géneros literários, e até as reivindicam, como no caso <strong>do</strong> paratexto de<br />

Sony Labou Tansi, que apresenta os seus textos dramáticos como sen<strong>do</strong> tragédias.<br />

No campo da crítica literária, deslocar-se para a fronteira significa ainda negociar<br />

parte <strong>do</strong> que ali se achará: negociar entre o se que ganha e o que se perde na operação de<br />

interpretação, pois tal como acontece com os textos <strong>do</strong> nosso passa<strong>do</strong>, sabemos que ao<br />

«traduzir» textos oriun<strong>do</strong>s de contextos diferentes nos arriscamos a perder algo <strong>do</strong><br />

«original». Contu<strong>do</strong>, as tragédias, por representarem os sofrimentos de seres humanos e as<br />

suas causas, passam as fronteiras com mais ou menos facilidade. Daí talvez a possibilidade<br />

de as percebermos apesar da distância no tempo e no espaço que nos separa delas. Posso<br />

215

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!