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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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tanto remete para o Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong> como para qualquer outro Esta<strong>do</strong>). 95 Da mesma<br />

maneira, quan<strong>do</strong> Mbembe fala das conotações grotescas e obscenas <strong>do</strong>s discursos<br />

populares, descreve mais uma vez algo que não parece específico da «poscolónia».<br />

Qualquer poder, autocrático ou não, na África ou na Europa, suscita contra-poderes, mas<br />

igualmente atitudes e discursos subversivos, e, para parafrasear Coronil, em qualquer parte<br />

<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> o corpo e as suas funções foram sempre utiliza<strong>do</strong>s (nomeadamente na imprensa<br />

satírica) para desafiar, ironizar, satirizar ou mesmo confirmar as hierarquias sociais e<br />

políticas.<br />

Estas reduções e simplificações parecem tanto mais surpreendentes se tivermos em<br />

conta que, nos <strong>do</strong>is primeiros capítulos <strong>do</strong> livro, o autor inseria a «poscolónia» num<br />

processo histórico de longa duração, insistia na sua matriz <strong>colonial</strong>, descreven<strong>do</strong> o modelo<br />

<strong>do</strong> potenta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong> (o administra<strong>do</strong>r <strong>colonial</strong>, etc). É preciso pois entender a rutura<br />

que instaura o terceiro capítulo relativamente aos <strong>do</strong>is primeiros: tanto «Du<br />

commandement» (I) como «Du gouvernement privé indirect» (II) estabeleciam uma clara<br />

genealogia que fazia da violência <strong>colonial</strong> a matriz da violência pós-<strong>colonial</strong>. Contu<strong>do</strong>,<br />

continuavam a faltar, por um la<strong>do</strong>, uma melhor contextualização (examinar o que acontecia<br />

ao nível local, de maneira a distinguir o comum <strong>do</strong> intrínseco) assim como uma descrição<br />

de <strong>do</strong>is fenómenos essenciais para entender as características <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong>: o<br />

neo<strong>colonial</strong>ismo e a globalização neoliberal. Proponho-me agora reler esses <strong>do</strong>is capítulos<br />

inicias socorren<strong>do</strong>-me de vários autores <strong>do</strong> Sul, mas, para parafrasear Boaventura de Sousa<br />

Santos, não de um Sul enquanto produto <strong>do</strong> Norte imperial.<br />

Relativamente à genealogia <strong>do</strong> “commandement”, o autor mostra que a colónia,<br />

que se tinha constituí<strong>do</strong> com o recurso à conquista violenta, só se aguentava através de um<br />

sistema de normas, de pressões, de atos diversos (da separação física aos maus tratos). No<br />

contexto da soberania <strong>colonial</strong>, o direito, acrescenta Mbembe, encontrava-se de um só<br />

la<strong>do</strong>. Do outro la<strong>do</strong>, «il n’y avait que tort et infraction» (Mbembe, 2005: 43). A articulação<br />

entre o «commandement» <strong>colonial</strong> e o «commandement» pós-<strong>colonial</strong> surge neste ponto<br />

preciso:<br />

Injustice des moyens et illégitimité des fins conspiraient pour faire place à une sorte<br />

d’arbitraire, d’inconditionnalité intrinsèque <strong>do</strong>nt on peut dire qu’ils furent le propre<br />

de la souveraineté <strong>colonial</strong>e. Les formes étatiques post<strong>colonial</strong>es ont hérité de cette<br />

95 «La postcolonie est une pluralité chaotique, pourvue d’une cohérence interne, de systèmes de signes bien à<br />

elle, de manière propre de fabriquer des simulacres ou de reconstruire des stéréotypes, d’un art spécifique de<br />

la démesure, de façons particulières d’exproprier le sujet de ses identités.» (Mbembe, 2005: 140)<br />

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