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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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Fora <strong>do</strong> acontecimento trágico ser-nos-ia possível não só manter um controlo<br />

relativo sobre os nossos destinos, mesmo se o acaso e os imprevistos desempenham papéis<br />

não desprezíveis, como achar as palavras para traduzir o que nos comove. «Dès lors, par<br />

contre, qu’elle est en proie à l’intensité de l’épreuve, cette marge s’amenuise jusqu’au point<br />

de devenir nulle» (Chirpaz, 2010: 12). Paralisa<strong>do</strong>s pelo pavor ou pela <strong>do</strong>r, quase que<br />

“medusea<strong>do</strong>s”, ficaríamos incapazes de reagir, seres subitamente passivos, reduzi<strong>do</strong>s à<br />

impossibilidade de traduzir e de transmitir o que nos assola. É o que acontece, diz Chirpaz,<br />

quan<strong>do</strong> surge um cataclismo natural ou uma guerra, ou seja, uma violência «desmedida»<br />

que destrói as nossas capacidades de resistência.<br />

O autor deixa de interpretar filosoficamente um acontecimento trágico – a sua<br />

intenção inicial – para privilegiar aqui o que o senso comum considera acontecimento<br />

trágico, pois para este só se torna trágico o acontecimento violento fora <strong>do</strong> comum.<br />

Mesmo quan<strong>do</strong> defende que a diferença entre o trágico e uma outra emoção violenta não<br />

tem a ver com a existência de uma certa violência, mas com o grau da sua intensidade, o<br />

autor remete ainda para o que o senso comum encara como trágico. Também se aproxima<br />

<strong>do</strong> senso comum ao insistir na impossibilidade de exprimir a <strong>do</strong>r, o que se torna, no seu<br />

texto, numa quase impossibilidade de expressar o trágico. O obstáculo linguístico neste<br />

ponto não se situa no trágico, pois com este situamo-nos já no pós-acontecimento, quan<strong>do</strong><br />

conseguimos finalmente pronunciar uma palavra sobre o que antecedeu, mas no momento<br />

preciso em que surge o acontecimento ou no momento em que este nos é comunica<strong>do</strong>,<br />

quan<strong>do</strong> a <strong>do</strong>r de facto nos paralisa.<br />

Se o trágico em Chirpaz consegue prescindir da literatura, para dizê-lo de outro<br />

mo<strong>do</strong>, se consegue a sua independência relativamente a esta, não se deixa enclausurar<br />

numa espécie de tautologia – tal acontecimento é trágico porque a vida é trágica e esta<br />

torna-se trágica porque coisas terríveis acontecem ao ser humano – própria de uma certa<br />

reflexão filosófica sobre os significa<strong>do</strong>s <strong>do</strong> trágico. Não se deixa enclausurar pelo que<br />

começa a tornar-se evidente: a palavra é de facto polissémica, evolui no decorrer <strong>do</strong> tempo<br />

e é utilizada em diferentes níveis de linguagem, o que contribui ainda mais para a sua<br />

complexidade.<br />

Desta maneira, as diversas perspetivas filosóficas sobre o trágico apresentam<br />

pontos de convergência. Em primeiro lugar, privilegiam um mo<strong>do</strong> assertivo/normativo de<br />

descrever o fenómeno, o que se traduz por estruturas sintáticas <strong>do</strong> tipo: «A tragédia ou o<br />

trágico são…», «Para se ter trágico é preciso….», «A verdadeira significação da tragédia»,<br />

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