24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

de hibridez a principal aporia das teorias pós-coloniais. A falha num certo raciocínio<br />

teórico pós-<strong>colonial</strong> seria a seguinte:<br />

L’inconvénient majeur de ces concepts d’hybridité, de créolisation et de parodie,<br />

c’est qu’ils supposent au départ, à l’instar de celui de métissage, des espèces<br />

végétales, animales ou culturelles ‘pures’ ou ‘authentiques’, espèces destinées à<br />

<strong>do</strong>nner, à l’issue du processus de croisement, des entités mêlées et, à ce titre,<br />

considérées peu ou prou comme inauthentiques. (Amselle, 2008: 23)<br />

Este tipo de postura equivale de facto a entender as sociedades contemporâneas<br />

como inautênticas por oposição a sociedades anteriores cunhadas pelo selo da<br />

autenticidade e da homogeneidade. Segun<strong>do</strong> Amselle, nunca houve homogeneidade nas<br />

sociedades pré-coloniais, pelo contrário, existiram entre elas muitas conexões, ou para<br />

utilizar um conceito forja<strong>do</strong> por Amselle, «branchements», que se traduziram na<br />

emergência de culturas em contacto. 21 Não hesita neste ponto em falar de fobia pós-<br />

<strong>colonial</strong> da mistura:<br />

Comme si les différentes cultures du monde n’avaient pas été sujettes, dès le départ,<br />

à toute une série de métissages ou d’hybridations. Mettre en avant l’hybridation<br />

actuelle des cultures du monde, c’est refuser l’ouverture potentielle de chaque<br />

culture à l’autre, et <strong>do</strong>nc refuser toute possibilité de communication entre elles au<br />

cours de l’histoire. (Amselle, 2008: 23) 22<br />

Numa reflexão sobre as modernidades e as suas múltiplas localizações, Friedman<br />

chega a conclusões semelhantes às de Amselle, a saber que a conexão e a interligação de<br />

uma pluralidade de centros sempre fizeram parte das histórias das sociedades humanas.<br />

Segun<strong>do</strong> a autora, julgar que houve só uma modernidade (a europeia) que se dissiminou<br />

21 É o que Pepetela retrata em parte em Lueji. Aqui todas as «fronteiras» (sociais, culturais, etc.) são<br />

apresentadas como porosas, abertas, negociáveis. É o caso quan<strong>do</strong> Lueji propõe casamento a Ilunga. Assistese<br />

a uma dupla transgressão de «fronteira». Em primeiro lugar, é ela que assume a dupla ação de escolher (um<br />

mari<strong>do</strong>) e de propor (o matrimónio ao homem escolhi<strong>do</strong>); em segun<strong>do</strong> lugar, casa com um estrangeiro, ou<br />

seja, mistura-se, mestiça-se e mestiça a sua linhagem. Trata-se de uma duplicidade que se encontra novamente<br />

nas suas motivações, onde se misturam o íntimo (o amor) e o coletivo (evitar a guerra, pois Tchinguri teria<br />

assim me<strong>do</strong> de entrar em guerra com um herdeiro <strong>do</strong> trono <strong>do</strong>s Luba) (Pepetela, 2003: 351-352).<br />

22 Esta será uma das suas principais críticas ao pensamento de Mignolo, que Amselle acusa de essencialismo<br />

ao construir o objeto “Cordillère des Andes”, com os seus corolários “pensamento” e “razão andina”. O<br />

facto de associar os fenómenos de hibridez às épocas moderna e contemporânea levá-lo-ia a negar ou<br />

minorar qualquer possibilidade de conexão entre culturas pré-colombianas. É o mesmo tipo de crítica que se<br />

encontra na leitura que Balandier (2007) faz da propensão de uma certa teoria pós-<strong>colonial</strong> para falar de<br />

hibridez: «On parle beaucoup d’hybridation, d’imbrication, de métissage; je tiens <strong>do</strong>nc à rappeler que le fait<br />

métis est une <strong>do</strong>nnée générale des sociétés et des cultures. Il n’y a pas de produit ‘pur’ en ce <strong>do</strong>maine, et les<br />

produits supposés ‘purs’ sont ceux que créent, par des artifices funestes et la violence, les régimes totalitaires»<br />

(Balandier, 2007: 23).<br />

20

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!