24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Bourdieu (1992) foi um <strong>do</strong>s grandes contribui<strong>do</strong>res para a elaboração de uma teoria<br />

<strong>do</strong> campo literário. Para ser breve, relembraria simplesmente que o campo adquiriu a sua<br />

autonomia na segunda metade <strong>do</strong> século XIX. Desenvolveu então mecanismos de<br />

reconhecimento e de exclusão, <strong>do</strong>tou-se de instâncias de legitimação próprias e de<br />

instrumentos críticos aptos a ler a obra e evidenciar o seu carácter plurívoco. Para o ator<br />

que se move no campo, importa ao mesmo tempo ver-se reconheci<strong>do</strong> pelos seus pares e<br />

adquirir um capital simbólico suficiente para importar para o interior <strong>do</strong> campo algo <strong>do</strong> seu<br />

projeto literário. Cada novo candidato procura pois atingir posições <strong>do</strong>minantes,<br />

mobilizan<strong>do</strong> para tal uma série de estratégias (literárias, estéticas, institucionais…) que lhe<br />

permitem «instalar-se» e contribuir para a redefinição <strong>do</strong> campo através das suas obras.<br />

Esta breve apresentação mostra não só a importância da «fronteira» (ao afirmar a<br />

sua independência, ou seja, ao colocar limites, o campo literário distingue-se assim de<br />

outros campos sociais) como o seu carácter intrinsecamente instável: as «fronteiras»<br />

flutuam em função das estratégias <strong>do</strong>s autores, da entrada de estéticas novas que obrigam a<br />

uma redefinição <strong>do</strong> literário, das classificações e desclassificações de obras e autores pelas<br />

instâncias de legitimação e consagração. Mas há mais: duas outras «fronteiras» mais subtis,<br />

mas tão móveis e instáveis como os seus limites externos, percorrem, ou dividem, o campo.<br />

Trata-se, por um la<strong>do</strong>, da «fronteira» que separa a literatura de grande produção da<br />

literatura de produção restrita e, por outro la<strong>do</strong>, da «fronteira» que separa as literaturas <strong>do</strong><br />

Norte das literaturas <strong>do</strong> Sul. Durante o século XX, foram vários os autores e as obras que<br />

contribuíram para um questionar <strong>do</strong>s limites em questão.<br />

Um Simenon, por exemplo, começou claramente a sua carreira <strong>do</strong> la<strong>do</strong> da grande<br />

produção da «fronteira» (romances e contos populares, antes de passar ao policial com a<br />

série Maigret) e só depois encetou uma produção romanesca mais ambiciosa. No caso <strong>do</strong><br />

escritor belga, a situação é tanto mais interessante já que o autor levou a cabo duas obras<br />

paralelas (Maigret e os seus «romances duros», como ele próprio os chamava), uma em cada<br />

tipo de produção. As instâncias de legitimação (crítica literária, universidades…)<br />

mantiveram o conjunto <strong>do</strong> la<strong>do</strong> da grande produção durante algum tempo antes de elas<br />

próprias participarem na redefinição da obra e, por consequência, na redefinição das<br />

«fronteiras» <strong>do</strong> campo (o que não era ti<strong>do</strong> como literatura passou a sê-lo).<br />

Ultimamente, foram as literaturas pós-coloniais que, em grande parte, participaram<br />

nos movimentos de «fronteira», isto é, que pelas suas escolhas estéticas (ruturas ao nível <strong>do</strong><br />

código linguístico, <strong>do</strong> código cultural <strong>do</strong>minante e <strong>do</strong> cânone) obrigaram o campo a rever o<br />

65

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!