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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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Em primeiro lugar, qualquer que seja o contexto de enunciação, os teóricos a que<br />

recorri encaram a tradução num senti<strong>do</strong> lato e metafórico. Assim, Jaaware (2002) assume e<br />

reivindica um conceito extremamente aberto, um conceito cujas fronteiras ultrapassam o<br />

senti<strong>do</strong> restrito da passagem de uma língua à outra. É a partir da Índia que repensa a<br />

«tradução» como operação de trasladação não só de uma língua para a outra como de um<br />

texto para o outro e ainda de um género para o outro. Para Jaaware, alguns escritores locais<br />

«traduziram» assim o romance como género literário para, através desta apropriação ou<br />

“canibalização”, dizer o seu mun<strong>do</strong> de outra maneira. Se, para o autor, alguns críticos<br />

reduziram a originalidade <strong>do</strong>s escritores em questão a uma mera cópia de um original<br />

inglês, ele próprio defende que os autores não se limitaram a importar e copiar modelos<br />

(«the model of simple mimesis cannot be used to understand them»). Segun<strong>do</strong> Jaaware,<br />

houve uma tradução da prática literária, a tradução <strong>do</strong> género romanesco, ou seja, não<br />

houve tradução de palavras ou de parágrafos de um original inglês, mas tradução de uma<br />

unidade maior. Vai ainda mais longe quan<strong>do</strong> diz que até os discursos sociais podem assim<br />

ser traduzi<strong>do</strong>s. Como vemos, a «tradução» abrange nesta perspetiva muito mais <strong>do</strong> que uma<br />

simples operação linguística e oferece ao hermeneuta um instrumento particularmente útil:<br />

It should be evident that a simple notion of imitation, copying, or even plagiarism is<br />

less helpful than the notion of translation. It is necessary, in fact, to consider the<br />

possibility of translating not an individual book, but a genre itself. (Jaaware, 2002:<br />

737)<br />

O que me parece estar aqui em evidência é a importância da «tradução» numa<br />

perspetiva crítica pós-<strong>colonial</strong>. De facto, em vários teóricos, as práticas literárias pós-<br />

coloniais são interpretadas por via da «tradução». É que escrever em línguas imperiais em<br />

certos contextos assemelha-se a uma interpretação/«tradução» de outras culturas, línguas,<br />

textos, práticas sociais, ou seja, escrever em francês, inglês ou português em certas zonas <strong>do</strong><br />

mun<strong>do</strong> significa trasladações numerosas e de naturezas diferentes de uma ou mais línguas,<br />

muitas vezes produzidas como subalternas, para uma só, com pretensão hegemónica.<br />

Gyasi (2003), que utiliza o conceito de maneira metafórica, defende justamente que a<br />

produção literária de um Chinua Achebe, de um Henri Lopes ou de um Ahma<strong>do</strong>u<br />

Kourouma pode ser interpretada como a «tradução» <strong>do</strong> conjunto de uma cultura para um<br />

certo público ocidental. A «tradução» é aqui encarada como um processo dinâmico, como<br />

uma «nova reformulação» de uma língua europeia por escritores africanos (Gyasi, 2003:<br />

144), que permite a escritores transporem parte de uma cultura produzida como<br />

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