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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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pelo mun<strong>do</strong> inteiro é erra<strong>do</strong>. Houve «modernidades policêntricas» (Friedman, 2008: 15) e<br />

não uma modernidade eurocêntrica. Para entender esta passagem <strong>do</strong> um ao múltiplo, é<br />

preciso também passar de uma abordagem exclusivamente temporal a uma abordagem<br />

espacial, assim como ter uma leitura pluridisciplinar das modernidades em questão (<strong>do</strong><br />

ponto de vista meto<strong>do</strong>lógico, o entrelaçamento entre ciências sociais e humanas relembra<br />

mais uma vez a abordagem pluridisciplinar da literatura comparada). Este olhar<br />

descentra<strong>do</strong> ajuda a entender que a Europa não foi o centro a partir <strong>do</strong> qual se difundiu a<br />

modernidade, mas que ela foi o espaço onde nasceram as narrativas que constituíram a<br />

Europa no centro em questão. Esta passagem <strong>do</strong> singular ao plural, da univocidade à<br />

plurivocidade, <strong>do</strong> homogéneo ao heterogéneo, explica a perspetiva a<strong>do</strong>tada por Friedman:<br />

«a polycentric approach that sees multiple and distinct centers that interacts with each other<br />

on a global landscape» (Friedman, 2008: 17). Tal pressupõe, sem dúvida, a existência de<br />

fronteiras muito mais porosas, moventes, entre espaços mas igualmente entre tempos e<br />

culturas. Voltarei mais à frente a esta questão da «fronteira» (Capítulo II.2), mas<br />

retenhamos por enquanto que noções como hibridez, fluidez, mobilidade, etc. são marcas<br />

que caracterizam as sociedades ao largo da sua história e não características supostamente<br />

intrínsecas aos tempos pós-coloniais.<br />

Ao trabalhar sobre as Américas Latinas, o historia<strong>do</strong>r Serge Gruzinski deparou-se<br />

assim com fenómenos de mestiçagem e de mobilidade no México <strong>do</strong> século XVI tanto no<br />

polo indígena como no polo europeu. Em La Pensée métisse (1999), considerava uma<br />

realidade plural num espaço determina<strong>do</strong>. Dois anos mais tarde, desejoso de ultrapassar um<br />

estu<strong>do</strong> local, «quase microscópico», segun<strong>do</strong> os seus próprios termos, defendia que o<br />

pensamento mestiço teria de ser ti<strong>do</strong> em conta a um outro nível. Num longo artigo<br />

publica<strong>do</strong> na revista Annales, achava ter encontra<strong>do</strong> na «Monarquia católica» (1580-1640) o<br />

espaço que traduzia melhor a globalidade <strong>do</strong> pensamento mestiço. A partir <strong>do</strong> seu trabalho<br />

sobre as Américas, constata que em numerosos <strong>do</strong>mínios (literatura, ciências naturais,<br />

merca<strong>do</strong>rias, homens) houve sempre circulação e conexões entre mun<strong>do</strong>s (Península,<br />

Américas, Índias, Áfricas) que foram ti<strong>do</strong>s como estanques por grande parte da<br />

historiografia ocidental. Na esteira de La Pensée métisse, estuda os fenómenos de hibridez – a<br />

regra e não a exceção nas sociedades humanas – a vários níveis (ciente da tensão entre local<br />

e global), cruzan<strong>do</strong> várias disciplinas (ciências sociais e humanas), num momento de<br />

mudança radical.<br />

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