24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

quietude das existencias: «Est-ce que le bonheur ou un simple instant de repos ne découvre<br />

pas des choses plus sérieuses et plus stables que l’agitation des passions?»<br />

Com Maeterlinck, desaparecem ainda o patético, a violência que dava a sua<br />

intensidade ao acontecimento trágico, o excecional da situação trágica: «Il ne s’agit plus<br />

d’un moment exceptionnel et violent de l’existence, mais de l’existence elle-même.» 155 Por<br />

outras palavras, o aparato <strong>do</strong> trágico contrai-se, até quase desaparecer <strong>do</strong> palco assim como<br />

<strong>do</strong>s discursos ti<strong>do</strong>s sobre o trágico. Não será exagera<strong>do</strong> afirmar que com Maeterlinck até<br />

deserta da linguagem para se refugiar no silêncio, na inquietude íntima ou na angústia de<br />

viver que assola muitos seres humanos. Neste ponto, Maeterlinck reencontra em parte a<br />

personagem clássica, dividida entre determinações opostas, incapaz de explicar o que a<br />

levou à desgraça, lugar da luta entre ratio e hubris, esta desmesura em que se origina muitas<br />

vezes a culpa <strong>do</strong> herói ou da heroína. Voltarei mais à frente a este ponto essencial <strong>do</strong> ser,<br />

ou da personagem dividida, atravessa<strong>do</strong> por forças antagónicas, mas retenho desde já que,<br />

mesmo na quietude <strong>do</strong> cenário descrito por Maeterlinck, ainda há espaço algures nos<br />

basti<strong>do</strong>res para algo inquietante, algo dificilmente dizível e que remete para esta parte<br />

sombria de qualquer homem:<br />

Il arrive à tout homme dans la vie quotidienne d’avoir à dénouer par des paroles<br />

une situation très grave. Songez-y un instant. Est-ce toujours en ces moments, est-<br />

ce même d’ordinaire ce que vous dites ou ce qu’on vous répond qui importe le<br />

plus? Est-ce que d’autres forces, d’autres paroles qu’on n’entend pas ne sont pas<br />

mises en jeu qui déterminent l’événement? (Maeterlinck, 1986: 108)<br />

A partir de Maeterlinck, o conceito conheceu uma evolução semântica que iria<br />

desembocar num trágico entendi<strong>do</strong> como fenómeno independente da sua atualização numa<br />

obra literária ou, no século XX, num filme. O filósofo alemão Max Scheler (O fenómeno <strong>do</strong><br />

trágico, 1915) participa na mudança semântica ao conceber o trágico como puro fenómeno,<br />

preexistente às obras em que se exprime, ou seja, um fenómeno que poderia ser objeto de<br />

descrição antes de ser analisa<strong>do</strong> numa das suas ilustrações literárias. No trecho seguinte é<br />

patente a anterioridade <strong>do</strong> trágico fenomenológico sobre a sua transformação em registo<br />

literário:<br />

155 Pela sua contribuição para a autonomização <strong>do</strong> trágico em relação ao teatro, Maeterlinck antecipa um <strong>do</strong>s<br />

pensa<strong>do</strong>res <strong>do</strong> trágico da condição humana no século XX, Miguel de Unamuno (1913). É sabi<strong>do</strong> que para<br />

este se impõe uma realidade universal, comum a to<strong>do</strong>s os homens: a sua finitude e a consciência que possuem<br />

desta, consciência que a seguir despertará diversas respostas (angústia, tristeza, revolta). É o que ele chama de<br />

sentimento trágico da vida. Ribard e Viala, porém, ignoram Maeterlinck e apontam em Unamuno a origem de<br />

um trágico independente da sua atualização em tragédias.<br />

175

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!