24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

O corpo sofre<strong>do</strong>r, o corpo degrada<strong>do</strong>, o “baixo material e corporal”, a relação de<br />

homologia entre este e o Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong> aparecem igualmente de maneira recorrente<br />

no teatro de Sony Labou Tansi. Aliás, a presença <strong>do</strong> corpo violenta<strong>do</strong> no Esta<strong>do</strong> pós-<br />

<strong>colonial</strong> assim como <strong>do</strong> corpo monstruoso <strong>do</strong> potenta<strong>do</strong> na obra <strong>do</strong> escritor congolês têm<br />

si<strong>do</strong> recentemente alvo da atenção da crítica. Trata-se de um corpo incontornável em peças<br />

de teatro que, como o vimos na análise ao paratexto, se reivindicam como tragédias.<br />

VI. 5. SONY LABOU TANSI: CARNE, CORPO, TERROR E TRAGÉDIA<br />

Estas características, centralidade <strong>do</strong> corpo, metáfora <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong> como<br />

corpo <strong>do</strong>ente, surgem logo nas primeiras tragédias <strong>do</strong> autor. Le trou [O buraco] (1976) 223<br />

encena o ex-Presidente deposto Mayam e a sua família num país imaginário sujeito a<br />

tensões e violências de Esta<strong>do</strong> (o Kabora, com Hozana como capital federal). 224 Um golpe<br />

de Esta<strong>do</strong>, fomenta<strong>do</strong> pela Bélgica, permitiu a deposição de Mayam e a chegada ao poder<br />

de Ramien de Nubigoa, um potenta<strong>do</strong> com estreitas ligações a potências estrangeiras. A<br />

ilha (Bota), para onde se retirou Mayam, possui um recurso natural raro que o poder central<br />

assim como ex-potências coloniais gostariam de explorar para o seu bem exclusivo. Mayam<br />

ameaça o poder central com a declaração de independência da região, embora tenha<br />

consciência de que esta decisão unilateral provocaria uma reação violenta por parte <strong>do</strong><br />

exército. Entretanto, vários loucos percorrem as regiões <strong>do</strong> país para anunciar o pior se<br />

Mayam e Ramien continuarem a lutar pela posse <strong>do</strong>s recursos naturais. É o que de facto<br />

acontece com o rebentar de uma guerra civil que provoca dezenas de milhares de mortos.<br />

Um <strong>do</strong>s loucos, Zagoubinoa, promete a reconciliação nacional e a esperança, mas Mayam,<br />

irrita<strong>do</strong> com a sua voz, manda abatê-lo. Pouco antes de morrer, Zagoubinoa revela a sua<br />

verdadeira identidade: trata-se na realidade de um oficial fiel a Mayam e apaixona<strong>do</strong> pela<br />

filha deste. O assassínio <strong>do</strong> louco traz maus augúrios para a reconciliação entre ambos os<br />

potenta<strong>do</strong>s.<br />

223 A peça Le trou é datada de 1976, mas só foi publicada por Lansman em 1998 no terceiro volume de teatro.<br />

De acor<strong>do</strong> com a editora, até à data da edição a peça nunca tinha si<strong>do</strong> encenada.<br />

224 O espaço de referência no teatro de Sony Labou Tansi é o da distopia, <strong>do</strong> lugar aterra<strong>do</strong>r, mas de uma<br />

distopia não necessariamente africana. Alguns elementos recorrentes atravessam o corpus: a tensão entre<br />

capital/província, a capital como centro de onde dimana o terror, assim como a toponímia (Hozana aparece<br />

em vários textos de Tansi).<br />

271

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!