24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

homólogo anglo-saxónico. Talvez o Próspero português, por causa das suas especificidades<br />

no sistema mun<strong>do</strong> (Santos, 1994: 49-137), se tenha matiza<strong>do</strong> com um toque de Caliban,<br />

mas não teria si<strong>do</strong> o suficiente para ver na maior miscigenação entre coloniza<strong>do</strong>res e<br />

coloniza<strong>do</strong>s o cunho de um (pós)<strong>colonial</strong>ismo alternativo. 27 O que tende a desaparecer<br />

neste tipo de perspetiva é a dimensão histórica que permite mostrar a importância da raça<br />

no passa<strong>do</strong> de Portugal. Para Ferreira, o lugar de enunciação, lugar onde o intelectual global<br />

experimenta um cosmopolitismo emancipa<strong>do</strong>r, explica em parte este tipo de pensamento:<br />

In a post<strong>colonial</strong>ism of postmodern philosophical contours, emanating from<br />

multiculturalist cosmopolitan sites, historical forgetfulness or selective recreation<br />

can lead to the invention of a past not marred by the racial violence that was the<br />

foundation of and accompanied histories of <strong>colonial</strong>ism, including their ‘post’<br />

variants. (Ferreira, 2007: 36)<br />

É consciente destas aporias e para<strong>do</strong>xos que abor<strong>do</strong> agora a questão da ligação<br />

natural entre literatura comparada e estu<strong>do</strong>s pós-colonias. Vimos que Ashcroft, Griffiths e<br />

Tiffin defendiam a perspetiva comparativa como própria ao estu<strong>do</strong> das literaturas pós-<br />

coloniais, mas sem nunca articular claramente esses campos. Existe de facto uma<br />

propensão de certos estu<strong>do</strong>s pós-coloniais para a comparação de casos, de obras, de<br />

práticas sociais. Resta saber o que a literatura comparada e os estu<strong>do</strong>s pós-coloniais têm em<br />

comum, mas também em certos pontos o que os distingue 28 para entender, por um la<strong>do</strong>,<br />

que as ligações entre campos, antes de serem naturais, são o resulta<strong>do</strong> de uma troca/partilha<br />

de conceitos, e, por outro la<strong>do</strong>, em que medida uma certa corrente teórica pós-<strong>colonial</strong> - o<br />

próprio Empire Writes Back, por exemplo - se afasta de certos pressupostos da ciência<br />

comparativa da literatura.<br />

De um ponto de vista epistemológico, é certo que a comparação, como a metáfora<br />

aliás, aparece como um recurso universal quan<strong>do</strong> se trata de definir um campo novo ou<br />

uma teoria nova, ou até uma descoberta científica. 29 As teorias pós-coloniais não escapam à<br />

27 Ferreira reconhece a importância das vozes alternativas – Santos, Mignolo, Quijano e outros pensa<strong>do</strong>res –,<br />

no contexto de teorias pós-coloniais <strong>do</strong>minadas pela produção anglo-saxónica. Admite que o ensaio de<br />

Santos acima referi<strong>do</strong> foi essencial para a reflexão pós-<strong>colonial</strong> de língua portuguesa; no entanto, vê na sua<br />

leitura da especificidade <strong>colonial</strong> portuguesa uma possível nova versão <strong>do</strong> luso-tropicalismo: «There is the<br />

potential for another version of Luso-tropicalism in the basic argument of fluid, ambiguous, even ‘complicit’<br />

relations between ‘calibanized’ Prosperos and ‘prosperized’ Calibans not apparently crossed by racism. (The<br />

gender neutrality of the Picture cannot but lead me to think along the lines of a specifically Luso-tropical<br />

homosociality)» (Ferreira, 2007: 31).<br />

28 No que tem a ver com a questão das línguas, por exemplo, a primeira reivindica uma abordagem plurilingue<br />

enquanto a teoria pós-<strong>colonial</strong> hegemónica é maciçamente monolingue.<br />

29 Os textos clássicos europeus no Novo Mun<strong>do</strong> são um exemplo paradigmático <strong>do</strong> recurso à comparação<br />

enquanto forma de conhecimento, de tornar inteligível o que escapa aos moldes de análise de um<br />

24

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!