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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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No capítulo dedica<strong>do</strong> ao Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong> aludi à permanência de<br />

representações herdadas <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> <strong>colonial</strong> junto de um certo senso comum no Norte<br />

global, representações tão profundamente enraizadas que fazem <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong><br />

um Esta<strong>do</strong> fracassa<strong>do</strong>, longe <strong>do</strong> modelo ti<strong>do</strong> como ideal (Capítulo III.1). A peça de<br />

Nkashama também aponta para a importância destas representações na reprodução de<br />

relações desiguais de poder entre Norte e Sul. No início <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> ato, May Britt<br />

denuncia o papel fulcral <strong>do</strong>s Média na construção de um continente como lugar de<br />

infelicidade, fracassa<strong>do</strong> por natureza: «Toute l’Afrique tient dans une caméra de photo.<br />

Comme dans des grillages en fer.» (II, 1).<br />

Ter-se-á nota<strong>do</strong> que a comparação que associa a representação a uma vedação<br />

sólida é feita numa peça que colocou o encarceramento no centro <strong>do</strong> seu dispositivo<br />

espacial: a casa como lugar sufocante, sem saídas, o quadro aperta<strong>do</strong> da representação <strong>do</strong><br />

continente, um quadro que, segun<strong>do</strong> May Britt, somente ganha senti<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> descrito<br />

por um observa<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Norte. O que ela diz então confirma a descrição teórica destas<br />

representações: «Sans moi, ces paysages ne seraient que des formes éphémères. Un univers<br />

en déperdition. Vous n’avez pas d’histoire. Aucune trace» (II, 1).<br />

Esta situação permite apontar para um elemento essencial: se o Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong><br />

é o que é junto de um certo público, é também, como o vimos há pouco, por causa <strong>do</strong><br />

Texto, que se distingue pela sua disponibilidade, adaptabilidade e simplicidade. Luen<strong>do</strong><br />

percebeu-o perfeitamente quan<strong>do</strong> responde a May Britt: «Des illusions qui ne se terminent<br />

jamais» (II, 1). São frequentemente de Luen<strong>do</strong> as descrições mais pertinentes <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />

pós-<strong>colonial</strong>, o que faz a personagem parecer em vários momentos porta<strong>do</strong>r da instância<br />

autoral. Quan<strong>do</strong> alude à trágica contradição de um país pobre apesar de contar com<br />

milhares de quadros universitários - «Le pays compte le plus grand nombre d’ingénieurs et<br />

de médecins au kilomètre carré. De véritables savants. […] Ils crèvent tous de misère, s’ils<br />

ne se sont pas fait exiler aux aurores boréales.» (II, 1) - ou quan<strong>do</strong> reflete sobre o<br />

sofrimento e a solidão <strong>do</strong>s escritores exila<strong>do</strong>s, não está muito longe <strong>do</strong> próprio Nkashama,<br />

que descreveu em discursos e entrevistas o preço a pagar por ser um intelectual da<br />

diáspora. 221<br />

221 Numa entrevista a Bernard Magnier, afirmava que o exílio significa muito mais <strong>do</strong> que a fuga à miséria ou<br />

a procura de glória no estrangeiro: «Il est notre <strong>do</strong>uleur commune. Ce sont surtout les meilleurs dans leurs<br />

disciplines respectives qui ont été forcés de partir. Ils courent dans le monde avec une grande détresse au<br />

cœur, parce qu’ils ont osé affronter des monstres iniques» (Nkashama, 1993: 366).<br />

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