24.06.2013 Views

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

No entanto, os três generalistas <strong>do</strong> trágico conseguiram dar conta <strong>do</strong> que a noção significa<br />

numa perspetiva diacrónica.<br />

No meu caso, juntei um Rosset e um Maeterlinck, mas deixei momentaneamente de<br />

fora um Spengler (1918), um Rosenzweig (1921), ou ainda um Benjamin (1928), pensa<strong>do</strong>res<br />

da possibilidade da impossibilidade de um trágico contemporâneo. Segun<strong>do</strong><br />

Lambropoulos, o primeiro está na origem de uma filosofia da história onde noções como<br />

centro, hierarquização, ou ainda destino tendem a desaparecer em prol da noção de tempo<br />

próprio a cada cultura. Nesta perspetiva, cada cultura experimentaria o seu próprio trágico,<br />

um trágico basea<strong>do</strong> na sua conceção <strong>do</strong> tempo. O segun<strong>do</strong>, leva<strong>do</strong> por uma perspetiva<br />

religiosa, rejeita a personagem trágica clássica por esta não conseguir extrair-se <strong>do</strong> seu «Eu»<br />

para criar uma comunidade. Trata-se de um carácter marca<strong>do</strong> pelo silêncio, pela solidão e<br />

pela introspeção. Desta rejeição inicial, decorreria uma segunda: a rejeição de qualquer<br />

forma artística assim como a possibilidade de um novo trágico. O que o interessa é o<br />

confronto moderno entre o homem absoluto, cujos paradigmas são Fausto ou Dom João,<br />

e o objeto absoluto. A tragédia moderna fracassaria ao representar o irrepresentável, o ser<br />

absoluto, o santo como herói, e esta constatação deveria levar o dramaturgo a perceber que<br />

a única narrativa possível é a da Revelação e da Redenção. Com o terceiro, encontraríamos<br />

a mesma distância ou dúvida relativamente não só à possibilidade de uma tragédia<br />

contemporânea como à interpretação universalista da tragédia clássica (a sua ética poden<strong>do</strong><br />

então servir de lição para qualquer homem). Na esteira de Rosenzweig, defende ainda<br />

Benjamin, embora o herói trágico, pelo seu sacrifício, sirva de base à edificação de uma<br />

comunidade ética, ele não tem consciência da sua própria ética e é ainda menos capaz de a<br />

exprimir. Volta-se assim ao carácter hierático e mu<strong>do</strong> descrito por Rosenzweig. Ainda de<br />

acor<strong>do</strong> com Lambropoulos, o mun<strong>do</strong> moderno a partir <strong>do</strong> qual escrevia Benjamin não foi<br />

por este encara<strong>do</strong> como trágico mas antes como melancólico. 184<br />

Ainda relativamente à complexidade da questão, convinha talvez interrogar a<br />

emergência de grandes textos teóricos sobre o trágico a seguir a guerras ou convulsões<br />

globais: Nietzsche em 1871, 185 Scheler durante a Primeira Guerra Mundial, Domenach após<br />

184 «Caught between nostalgia and anticipation, Benjamin and other people of his generation aimed to give<br />

the godforsaken world of modernity an alternative, messianic vision, with the ‘angel of history’ providing<br />

hope, utopia and redemption. It all hinges on the conviction that the historical predicament is melancholic,<br />

not tragic, as mortals look forward to Judgment Day.» (Lambropoulos, 2006: 129)<br />

185 O Nascimento da tragédia está percorri<strong>do</strong>, estrutura<strong>do</strong>, pela figura <strong>do</strong> duplo, da duplicidade, <strong>do</strong> dúplice:<br />

dionisíaco vs apolónio, Coro vs palco, Édipo/Ésquilo vs Eurípides, etc. Esta duplicidade também se encontra<br />

nas circunstâncias em que o livro foi escrito, em parte quan<strong>do</strong> Nietzsche era enfermeiro durante o cerco a<br />

Metz na guerra de 1870-1871 e em convalescença de uma <strong>do</strong>ença contraída na frente, ou seja, num momento<br />

209

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!