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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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no seio <strong>do</strong> pensamento filosófico <strong>do</strong> trágico é visível algo desse dinamismo que apontava<br />

há pouco.<br />

Por outro la<strong>do</strong>, o trágico também pode ser li<strong>do</strong> como estrutura narrativa, uma<br />

espécie de sintaxe, entendida de mo<strong>do</strong> metafórico, com momentos recorrentes (a<br />

advertência inicial, as advertências intermediárias, a palavra que compromete a personagem<br />

trágica, etc.), independentemente <strong>do</strong> género pratica<strong>do</strong>, pois esta sintaxe encontrar-se-ia<br />

nesta hipótese tanto numa tragédia como num romance ou ainda num filme. É o que<br />

Aristóteles parece sugerir na sua Poética ao descrever concretamente não só os mecanismos<br />

que estruturam uma boa tragédia bem como os efeitos que favorecem o aparecimento e o<br />

fim <strong>do</strong> trágico como efeito. Reler a Poética para entender parcialmente o que possa vir a<br />

significar o trágico <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> pós-<strong>colonial</strong> poderá ajudar a desenhar os novos caminhos <strong>do</strong><br />

trágico. A partir deste ponto de vista, o trágico permite focar a estrutura profunda de<br />

muitas obras, entender parte <strong>do</strong>s significa<strong>do</strong>s que nelas circulam, evidenciar um elemento<br />

próprio <strong>do</strong> texto que favorece o seu entendimento. Esta atenção à estrutura <strong>do</strong> texto<br />

remete para uma abordagem filológica, próxima da de um Szondi, por exemplo, no seu<br />

trabalho sobre Édipo (2003: 81-87).<br />

Esta necessidade de centrar-se no texto, de tentar encontrar nele parte das soluções<br />

para os problemas que coloca não impede, como veremos, uma certa articulação com o<br />

social, o que é diferente da conceção <strong>do</strong> texto como espelho de um contexto social<br />

particular. Aproximo-me assim de Bollack relativamente à interpretação textual. O que este<br />

especialista e tradutor <strong>do</strong>s trágicos gregos diz da análise de Eurípides poderá certamente<br />

ajudar a entender esta conceção <strong>do</strong> trabalho hermenêutico:<br />

Les contradictions se découvrent à mesure que l’on lit, les impasses ou les apories<br />

se résolvent, approfondies par l’interrogation, puis par la réflexion qu’elle suscite.<br />

L’énigme déposée dans la matière du texte fournit la seule clé, avant le jeu lui-<br />

même. (Bollack, 2005: 6) 2<br />

No caso <strong>do</strong>s trágicos gregos, acrescenta o mesmo autor, não são raras as tentativas<br />

de ver nas peças meros <strong>do</strong>cumentos que supostamente refletiriam, por exemplo, a<br />

2 Do ponto de vista <strong>do</strong> recetor, Jean-Marie Schaeffer, especialista em estética e teoria das artes, advoga no<br />

mesmo senti<strong>do</strong> uma ficção que parece existir como um sistema autoconti<strong>do</strong>, um to<strong>do</strong> auto-suficiente: «Une<br />

fiction artistique […] est activée sur le mode de l’immersion: elle est «vécue», et elle est stockée dans la<br />

mémoire du lecteur ou du spectateur comme univers virtuel clos sur lui-même et se suffisant à lui-même,<br />

quitte à ce que ses traces mémorielles soient réactivées plus tard dans des situations réelles par le biais d’une<br />

dynamique associationniste.» (Schaeffer, 2005: 24).<br />

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