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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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imitação deveria proporcionar ao espeta<strong>do</strong>r um certo prazer («assaisonnements») e suscitar<br />

junto deste duas emoções adversas (piedade e temor) para o purgar das emoções deste tipo.<br />

Os analistas <strong>do</strong> texto não deixaram de assinalar a estranheza <strong>do</strong>s sentimentos em<br />

questão: porquê <strong>do</strong>is (Escola, 2002; Escola, 2010), e porquê aqueles <strong>do</strong>is e não outros<br />

(Escola, 2002, Magnien, 1990)? Terry Eagleton, grande compila<strong>do</strong>r das sucessivas leituras<br />

da Poética, apontou as três hipóteses recorrentes: o recetor experimenta um certo prazer (1)<br />

porque a purga daquelas emoções é em si agradável, (2) porque o ser humano gosta de ver<br />

representações, mesmo se se trata de imitações de desastres, ou ainda (3) porque a tragédia<br />

consegue dar um senti<strong>do</strong> ao sofrimento, um significa<strong>do</strong> «agradavelmente inteligível»<br />

(Eagleton, 2003: 169).<br />

De facto, logo no início <strong>do</strong> seu trata<strong>do</strong>, Aristóteles aponta para o prazer que o ser<br />

humano sente ao contemplar representações de factos ou acontecimentos terríveis que na<br />

realidade suscitariam a sua repulsão. 170 No mesmo lugar (IV), acrescenta que se o ser<br />

humano usufrui essas representações de coisas terríveis é igualmente pelo facto de gostar<br />

de aprender, o que lhe permitiria tomar consciência <strong>do</strong> ser de cada coisa. A tragédia não<br />

escapa então a esta combinação entre prazer e aprendizagem. O que ensinam então ao<br />

recetor o sofrimento e a desgraça das personagens trágicas? Aristóteles nota que mesmo<br />

nas tragédias que evidenciavam uma intriga bem construída, com peripécias,<br />

reconhecimento e um fim explicável pela própria lógica da intriga, mesmo nessas tragédias<br />

o acaso podia desempenhar um papel importante. Sophie Klimis observa a este propósito<br />

que o recetor não entende somente a sucessão <strong>do</strong>s acontecimentos que constituem a<br />

intriga:<br />

Au travers de cette compréhension, c’est l’universel de sa condition humaine qui lui<br />

est dévoilé: sa recherche perpétuelle du sens et de la maîtrise de sa propre existence,<br />

au travers de l’action délibérée et volontaire, mais toujours sur le fond omniprésent<br />

d’une déprise puisque cette action peut être portée par la chance ou anéantie par la<br />

malchance.» (Klimis, 2003: 482)<br />

Outros analistas da tragédia assinalaram a indissociabilidade na tragédia <strong>do</strong> prazer<br />

estético, <strong>do</strong> impacto quase físico no recetor <strong>do</strong> acontecimento patético, e <strong>do</strong> ensino ético<br />

que dela retira. Ion Omesco (encena<strong>do</strong>r, dramaturgo e estudioso romeno), numa<br />

170 Temos prazer com as representações, dizia Aristóteles, e a melhor evidência disso seria o seguinte: «nous<br />

prenons plaisir à contempler les images les plus exactes de choses <strong>do</strong>nt la vue nous est pénibles dans la réalité,<br />

comme les formes d’animaux les plus méprisés et les cadavres» (IV).<br />

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