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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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tragédia. Ambos utilizam a piedade e o temor como motor para suscitar empatia e interesse<br />

junto <strong>do</strong> espeta<strong>do</strong>r, mas o primeiro, pelo seu fim feliz, favorece o efeito de catarse,<br />

enquanto o segun<strong>do</strong>, ao mostrar a dificuldade, ou até a impossibilidade, de gerir os<br />

sofrimentos pós-genocídio, o impede.<br />

Entre to<strong>do</strong>s os «condimentos» que entram na composição de uma tragédia,<br />

Aristóteles dava a primazia à história, o que aliás é confirma<strong>do</strong> no capítulo VII, onde<br />

aborda a maneira de estruturar a intriga, com encadeamento pertinente entre início, meio e<br />

fim, as histórias bem conseguidas deven<strong>do</strong> não começar nem acabar ao acaso. Esta ênfase<br />

dada à estrutura da intriga também supõe que esta tenha uma certa extensão - o<br />

pressuposto de que a mais extensa das tragédias seria a mais «bonita» (mais uma vez, esta<br />

necessidade de procurar dar prazer) -, subenten<strong>do</strong>-se a necessidade de uma certa extensão<br />

se o autor quiser explicar a passagem de um esta<strong>do</strong> a outro (da felicidade à desgraça, por<br />

exemplo). 175<br />

A história, a escolha <strong>do</strong>s episódios, a organização destes desempenham um papel<br />

essencial e Aristóteles distingue claramente neste ponto a história da poesia (a arte trágica<br />

era na altura regularmente designada por este vocábulo). O que distingue uma da outra não<br />

é a forma, verso ou prosa, mas a sua relação com a função da narração: «Le rôle du poète<br />

est de dire non pas ce qui a réellement eu lieu mais ce à quoi on peut s’attendre, ce qui peut<br />

se produire conformément à la vraisemblance ou à la nécessité» (IX). Nota-se, en passant,<br />

que assim Aristóteles se torna um poderoso alia<strong>do</strong> para os que se opõem à conceção de<br />

literatura como mero reflexo <strong>do</strong> social: se a literatura exprime, em parte, o social, é antes de<br />

mais, nomeadamente no romance como no teatro, organização de uma ação e de caracteres<br />

de maneira a suscitar um certo prazer estético junto de um recetor ou de uma comunidade<br />

de recetores.<br />

Esta insistência na preponderância da intriga, da necessária ou verosímil sucessão<br />

de acontecimentos, não invalida para Aristóteles os «golpes de teatro», estes ten<strong>do</strong> a<br />

vantagem de tornar as histórias ainda mais «bonitas» (IX). O que significa que as<br />

reviravoltas na intriga, consecutivas ao reconhecimento (o que leva da ignorância ao<br />

conhecimento) e à peripécia (a orientação da ação em senti<strong>do</strong> contrário), devem responder<br />

a uma necessidade interna e não a uma intervenção artificial (o Deus ex maquina, por<br />

exemplo). O reconhecimento melhor consegui<strong>do</strong>, o mais «bonito», diz Aristóteles, é o que<br />

175 «L’étendue qui permet le passage du malheur au bonheur ou du bonheur au malheur à travers une série<br />

d’événements se succédant selon la vraisemblance ou la nécessité, offre une limite satisfaisante.» (VII)<br />

198

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