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Barão

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imaginação difícil de ser moderada. Tem o espírito menos justo do que penetrante, o<br />

humor fácil mas desigual, um rosto comum, mas unia fisionomia que promete uma<br />

alma e que não mente; pode-se ir a ela com indiferença, mas não deixá-la sem<br />

emoção. Outras têm boas qualidades que lhe faltam; outras têm mais acentuadas as<br />

que ela tem; mas ninguém tem qualidades mais bem ajustadas para criar um caráter<br />

feliz. Ela sabe tirar proveito de seus próprios defeitos; e se fosse mais perfeita, ela<br />

agradaria muito menos.<br />

Sofia não é bela; mas perto dela os homens esquecem as mulheres belas e<br />

estas sentem-se descontentes consigo mesmas. Mal parece bonita à primeira vista,<br />

porém quanto mais a vêem mais se torna bela; ganha nisso em que tantas outras<br />

perdem; e o que ganha não perde mais. Podem ter olhos mais bonitos, uma boca<br />

mais bela, uma figura mais imponente; mas não pode haver cintura mais bem feita,<br />

tão bela tez, mão mais branca, pé mais delicado, olhar mais doce, fisionomia mais<br />

agradável. Sem ofuscar ela interessa; ela encanta, e não se pode dizer porque. 3<br />

Na construção deste ideal de universo civilizado 4 , caberia a mulher ser o símbolo dos bons<br />

modos e da educação. Para tanto o estado moderno é responsável pela introdução daquilo que é<br />

denominado no livro de Eric Hobsbawm Nações e Nacionalismo desde 1780 ―patriotismo estatal‖,<br />

introduzido no século XIX e desenvolvido no século XX. Tiveram papel proeminente neste processo a<br />

burocratização estatal e a democratização política. A burocratização do estado tornou esta instituição<br />

presente cotidianamente na vida dos cidadãos, por meio da realização de censos comuns e pela<br />

exigência de representações interpessoais. Rousseau continua enfatizando:<br />

Sofia gosta de atavios e entende disso; sua mãe não tem outra camareira; tem<br />

muito bom gosto para se arranjar; mas detesta os vestidos ricos; nos seus vê-se<br />

sempre a simplicidade unir-se à elegância; não aprecia o que brilha e sim o que lhe<br />

vai bem. Ignora quais as cores da moda mas sabe admiravelmente as que lhe são<br />

favoráveis. Não há jovem que se vista com menos requinte e nenhuma que se<br />

apresente mais requintadamente arranjada; nenhuma peça de sua toilette se deve<br />

ao acaso, e o artifício não aparece em nenhuma. Enfeita-se com muita modéstia<br />

aparentemente, mas com muita faceirice na realidade; não exibe seus encantos;<br />

cobre-os, mas, cobrindo-os, faz com que possam ser imaginados. Vendo-a, dizem:<br />

eis uma jovem modesta e bem comportada; mas enquanto permanecem a seu lado,<br />

os olhos erram por toda a sua pessoa sem que os possam arrancar dela. É até de<br />

se imaginar que tudo isso tão simples foi arranjado para ser desarranjado peça por<br />

peça.<br />

Sofia tem talentos naturais; ela os sente e não os desdenha; mas não tendo<br />

tido a possibilidade de pôr muita arte em seu cultivo, contentou-se com exercitar sua<br />

bonita voz em cantar bem e com gosto, seus pezinhos em andar com leveza, com<br />

facilidade e graça, em fazer mesuras em quaisquer situações sem embaraço. De<br />

resto não teve como professor de canto senão seu pai, como professora de dança<br />

senão sua mãe; e um organista da vizinhança deu-lhe ao cravo algumas lições de<br />

3 Ibidem, p.462.<br />

4 Outro exemplo do modelo ideal a ser adotado pelo gênero feminino foi o imaginário social positivista de Auguste<br />

Conte, Clarisse Ismério enfatiza: “O Positivism, uma doutrina criada por Auguste Conte, durante o período de<br />

instauração da República veio organizar a sociedade frente ao caos resultante de muitos anos de regime<br />

monárquico. A simbologia utilizada do discurso conteano, em relação à educação da mulher, fora criada com base<br />

em arquétipos universais e veio ao encontro dos anseios conservadores da época, legitimando a permanência da<br />

mulher no espaço privado, produzindo um achatamento cultural e profissional.” Ver: ______. Mulher: a moral e o<br />

imaginário (1889 -1930). Porto Alegre: EDIPUCRS, 1995, p.83.<br />

Jorge Luiz de França 102

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