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Barão

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acompanhamento, que ela cultivou depois sozinha. A princípio não pensava senão<br />

em fazer com que sua mão ressaltasse sobre as teclas pretas, depois achou que o<br />

som acre e seco do cravo tornava mais suave o som de sua voz; pouco a pouco se<br />

tornou sensível à harmonia; finalmente, em crescendo, começou a sentir os<br />

encantos da expressão e a amar a música em si. Mas é um gosto mais do que um<br />

talento; não sabe decifrar uma ária pela partitura. 5<br />

A democratização política fez com que se adotasse uma nova forma de lealdade e de<br />

legitimação do estado, uma vez que o cidadão, ao realizar suas escolhas políticas, precisa definir um<br />

centro de lealdade, que passou a ser o estado. Daí adveio uma espécie de religião cívica, intensificada<br />

através da educação primária, que resultou na criação de novas obrigações e laços entre os indivíduos.<br />

A existência do patriotismo nacional possibilitou a criação de um arcabouço histórico-cultural comum e<br />

a superação de disparidades sociais evidentes, sendo fundamental para unir segmentos humanos que<br />

se diferenciaram de maneira bastante clara com o crescimento da industrialização. 6 Nesta ótica<br />

Rousseau mostra:<br />

O que Sofia sabe mais a fundo, e que lhe fizeram aprender com mais cuidado,<br />

são os trabalhos de seu sexo, mesmo aqueles de que não se lembram, como cortar<br />

e costurar seus vestidos. Não há trabalho de agulha que não saiba fazer e que não<br />

faça com prazer; mas o trabalho que prefere a qualquer outro é o de fazer renda,<br />

porque nenhum outro dá atitude mais agradável e em nenhum os dedos se<br />

exercitam com mais graça e ligeireza. Dedicou-se também a todas as tarefas do lar.<br />

Conhece a cozinha e a copa; sabe os preços dos mantimentos; conhece-lhes as<br />

qualidades; sabe muito bem fazer suas contas; serve de mordomo para sua mãe.<br />

Feita para ser um dia mãe de família ela própria, governando a casa paterna<br />

aprende a governar a dela; é capaz de atender às funções dos criados e sempre o<br />

faz de bom grado. Nada se dirige tão bem como o que se sabe executar: é a razão<br />

de sua mãe para ocupá-la assim. Sofia não vai tão longe, entretanto; seu primeiro<br />

dever é o de filha e é agora o único que pensa em cumprir. Sua única intenção é<br />

servir sua mãe e aliviá-la de parte das tarefas. Contudo, é verdade que não faz tudo<br />

com igual prazer. Por exemplo, embora seja gulosa, não gosta de cozinhar; há<br />

pormenores que a desgostam; nunca encontra bastante limpeza. É a este respeito<br />

de extrema delicadeza, e é essa delicadeza levada ao máximo que se tornou um de<br />

seus defeitos: deixaria perder-se o jantar para não manchar sua manga. Nunca quis<br />

meter-se no jardim pela mesma razão; a terra parece-lhe suja; mal depara com um<br />

pouco de esterco e já lhe sente o cheiro. 7<br />

Finalmente o autor coloca Sofia no plano do espaço privado. Ser mulher neste universo é ter a<br />

consciência de pertencer ou ter pertencido a uma entidade política durável. Neste sentido a<br />

representação construída em torno das personagens femininas foi importante na criação de<br />

sentimentos que tornaram viáveis o estabelecimento de um estado, no qual abarcava determinada<br />

5 ROUSSEAU, J. J. Emílio ou Da Educação... Op. Cit., p.462-463.<br />

6 Cf. HOBSBAWM, Eric J. Nações e Nacionalismo desde 1780: programa, mito e realidade. Rio de Janeiro: Paz e<br />

Terra, 1990.<br />

7 ROUSSEAU, J. J. Emílio ou Da Educação... Op. Cit., p.463-464.<br />

Jorge Luiz de França 103

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