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Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

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prevenção. Mas a prevenção da gravi<strong>de</strong>z in<strong>de</strong>sejada não <strong>é</strong> da or<strong>de</strong>m da prevenção <strong>de</strong> <strong>um</strong>a<br />

qualquer doença. É da or<strong>de</strong>m das escolhas positivas e liberais sobre a maior felicida<strong>de</strong> possível<br />

para o maior número possível <strong>de</strong> pessoas. Trata-se <strong>de</strong> educação sexual obrigatória e continuada<br />

no ensino público e nos media; <strong>de</strong> <strong>um</strong>a educação sexual contra a discriminação <strong>de</strong> g<strong>é</strong>nero;<br />

contra a discriminação com base na orientação sexual; <strong>um</strong>a educação com mo<strong>de</strong>los <strong>é</strong>ticos<br />

centrados na pessoa e no cidadão, no seu corpo e nas relações com os outros, não em qualquer<br />

mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> família. Muito menos na submissão aos ditames patriarcais herdados dos pastores da<br />

Palestina ou dos misóginos do Vaticano.<br />

Precisamos <strong>de</strong> falar claro e alto para os pró-vida. Contra os pró-vida. Não para os convencer,<br />

porque quem pertence a seitas religiosas não quer ouvir. Nem po<strong>de</strong>, pois a sua opção doutrinária<br />

<strong>é</strong> contraditória com o raciocínio aberto. Trata-se <strong>de</strong> exigir que não nos retirem a nossa liberda<strong>de</strong><br />

e não retirem a liberda<strong>de</strong> do nosso contrato social. Trata-se <strong>de</strong> não <strong>de</strong>ixar que nos imponham<br />

(isto <strong>é</strong>: que continuem a impor como têm feito nos últimos...s<strong>é</strong>culos) as suas escolhas sectárias.<br />

Escolhas essas que são <strong>um</strong> direito e <strong>um</strong>a liberda<strong>de</strong> que lhes assiste e que lhes foi concedida<br />

pelos que, como nós, andam há s<strong>é</strong>culos a lutar pela laicida<strong>de</strong>, pela liberda<strong>de</strong> e pela igualda<strong>de</strong>.<br />

Carnaval<br />

(Webpage, 13.02.02)<br />

Não gosto do Carnaval. Nunca gostei do Carnaval. Durante muito tempo não me preocupei em<br />

perceber porquê, mas agora sinto-me obrigado a fazê-lo. Para não passar por “gr<strong>um</strong>py old man”,<br />

cínico ou elitista.<br />

As explicações históricas e antropológicas do Carnaval valem o que valem. Elas explicam como<br />

(e às vezes porquê) as coisas são o que são. Mas nunca essas explicações <strong>de</strong>vem ser<br />

transformadas em legitimações. Não há provavelmente pior tendência contemporânea do que<br />

aquela que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que as tradições <strong>de</strong>vem ser preservadas pelo simples facto <strong>de</strong> o serem.<br />

Sabe-se que o Carnaval entrou no calendário cristão, e especificamente no católico, como <strong>um</strong><br />

período <strong>de</strong> licenciosida<strong>de</strong> antes da entrada no longo período dos sacrifícios rituais da Quaresma.<br />

As origens “pagãs” (i.e., <strong>de</strong> religiões que não a cristã...) do Carnaval pren<strong>de</strong>r-se-iam, por sua<br />

vez, com a marcação ritual dos ciclos lunares e/ou solares, âncoras simbólicas para a<br />

ritualização da vida colectiva. Assim, o auge da noite do Inverno seria simbolicamente<br />

contrariado com performances estri<strong>de</strong>ntes, l<strong>um</strong>inosas, ígneas, como que exorcizando a<br />

escuridão e os fantasmas (daí o uso da máscara, tradicionalmente, e em Portugal, representando<br />

figuras diabólicas) e propiciando a chegada rápida dos prazeres diurnos do calor, da Primavera,<br />

da libertação dos sentidos e do <strong>de</strong>sejo. Com a <strong>de</strong>scoberta e colonização do Novo Mundo,<br />

sobretudo no hemisf<strong>é</strong>rio Sul, <strong>de</strong>u-se o resultado inesperado <strong>de</strong> o Carnaval ser celebrado em<br />

pleno Verão, tornando a sua licenciosida<strong>de</strong> em algo mais do que <strong>de</strong>sejo: na sua actualização<br />

extrema.<br />

Em qualquer caso, o Carnaval – ou seus equivalentes noutras culturas e enquadramentos<br />

religiosos – apresenta-se como período <strong>de</strong> licenciosida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> comportamentos anti-normativos.<br />

As suas principais características seriam a inversão e a transgressão. Mas não <strong>é</strong> preciso ser<br />

particularmente inteligente para perceber o lugar que <strong>um</strong>a festa <strong>de</strong>ssas ocupa n<strong>um</strong> sistema <strong>de</strong><br />

ciclicida<strong>de</strong> festiva ao longo <strong>de</strong> <strong>um</strong> ano. Por <strong>um</strong> lado, as inversões acabam por ressaltar aquilo<br />

que invertem, a or<strong>de</strong>m. Por outro, o facto <strong>de</strong> estas festas serem temporárias e calendares, faz<br />

com que elas antecipem tamb<strong>é</strong>m o regresso à normalida<strong>de</strong>. Assim, a transgressão dá lugar – e<br />

reforça, mesmo – a or<strong>de</strong>m.<br />

Traduzindo por palavras mais simples, e ditas por algu<strong>é</strong>m que vive (ou quer viver) n<strong>um</strong>a<br />

mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> o mais livre possível da ritualida<strong>de</strong> colectiva: festas <strong>de</strong> inversão e transgressão<br />

como o Carnaval acabam por reproduzir a or<strong>de</strong>m mais do que subvertê-la. Percebo agora que foi<br />

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