13.04.2013 Views

Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

A Esquerda entre as eleições e a situação em Israel-Palestina<br />

(Webpage, 13.04.02)<br />

Res<strong>um</strong>o da situação: após a birra <strong>de</strong> Guterres por causa <strong>de</strong> <strong>um</strong>a <strong>de</strong>rrota em eleições locais,<br />

seguiu-se <strong>um</strong>a campanha eleitoral marcada, entre outras vergonhas, pelo futebol e pela<br />

construção civil. Na sequência <strong>de</strong> tão dignificantes eventos, a direita (envergonhadamente autoproclamada<br />

como “centro-direita”) ganhou as eleições. Paulo Portas chegou ao po<strong>de</strong>r porque a<br />

direita dita civilizada não hesita <strong>um</strong> minuto em recorrer à direita caceteira quando precisa <strong>de</strong><br />

maioria – assim como, historicamente, nunca hesitou em negar a <strong>de</strong>mocracia e recorrer a<br />

versões fascizantes quando esta dá <strong>de</strong>masiado po<strong>de</strong>r aos cidadãos.<br />

Formado o governo, duas características saltam à vista: <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a presença d<strong>um</strong> senhor do BCP,<br />

at<strong>é</strong> <strong>um</strong> senhor advogado ligado à construção civil, passando por <strong>um</strong> outro do grupo Mello e por<br />

vários ligados à Opus Dei, quase apetece subscrever o velho discurso do PC sobre os “gran<strong>de</strong>s<br />

grupos” e as “gran<strong>de</strong>s famílias”. Elas voltaram. Paz às nossas almas. Por outro lado, já há sinais<br />

<strong>de</strong> que o governo não preten<strong>de</strong>, afinal, mexer em nenh<strong>um</strong> problema estrutural: os caciques<br />

autárquicos continuarão a receber as suas prebendas, os clubes <strong>de</strong> futebol não serão tocados.<br />

Tudo bem, portanto: <strong>é</strong> a vez do PSD, antes <strong>de</strong> ser, outra vez, a vez do PS.<br />

A esquerda, entretanto, prepara o seu doce remanso. O PS não parece ter tirado ilações da<br />

<strong>de</strong>rrota, pois continua a imaginar-se como casa gran<strong>de</strong> da esquerda e a falar do rendimento<br />

mínimo garantido como acontece com aquelas pessoas que, tendo <strong>um</strong> dia obtido <strong>um</strong> gran<strong>de</strong><br />

sucesso, relembram o facto vezes sem conta como se a sua vida tivesse parado ali. O PC vai-se<br />

comendo por <strong>de</strong>ntro, at<strong>é</strong> ao dia em que <strong>de</strong>sapareça, com <strong>um</strong>a fuga dos seus melhores quadros<br />

para o PS, on<strong>de</strong> com certeza contribuirão ainda mais para a confusão reinante. O Bloco <strong>de</strong><br />

Esquerda sorri com a meia vitória da eleição <strong>de</strong> mais <strong>um</strong> <strong>de</strong>putado e – espera-se – consolidará a<br />

sua posição <strong>de</strong> criador <strong>de</strong> novas hegemonias na esquerda, face à tibieza do PS e ao <strong>de</strong>scalabro<br />

do PC.<br />

Mas não há como <strong>um</strong> período <strong>de</strong> governação da direita para que a esquerda pense <strong>um</strong> pouco<br />

sobre si própria. Pessoalmente, já estava a ficar saturado da sucessão <strong>de</strong> campanhas eleitorais,<br />

das urgências e priorida<strong>de</strong>s que elas implicam, do adiamento das reflexões e discussões internas.<br />

Agora isso <strong>é</strong> possível e, curiosamente, o campo da política internacional <strong>é</strong> o campo i<strong>de</strong>al para<br />

fazê-lo. Porquê? Porque a política internacional permite duas atitu<strong>de</strong>s fundamentais para a<br />

reflexão: abstracção e distância. Nunca conhecemos <strong>de</strong> perto e bem os problemas dos outros<br />

países; somos susceptíveis à propaganda <strong>de</strong> ambas as partes n<strong>um</strong> conflito; por muito solidários e<br />

<strong>é</strong>ticos que sejamos, os assuntos externos não nos tocam com a premência <strong>de</strong> <strong>um</strong> a<strong>um</strong>ento <strong>de</strong><br />

impostos, preços ou <strong>de</strong>semprego; e permite o pensamento i<strong>de</strong>ológico sobre o que se quer, o que<br />

se acha bem ou mal, as posições <strong>é</strong>ticas a tomar.<br />

Os últimos meses têm sido f<strong>é</strong>rteis em assuntos internacionais com reflexos internos, sobretudo<br />

na esquerda. Primeiro foi o Kosovo, <strong>de</strong>pois o 11 <strong>de</strong> Setembro e, agora, a situação em Israel-<br />

Palestina. Escrevo este texto para explicar – a mim próprio, se calhar, mas tamb<strong>é</strong>m aos outros –<br />

porque não fui nem à manifestação no Camões nem ao cordão h<strong>um</strong>ano da embaixada <strong>de</strong> Israel<br />

at<strong>é</strong> as Nações Unidas. Não fui à primeira porque se tratou <strong>de</strong> mais <strong>um</strong>a manifestação organizada<br />

pelas organizações fantasma do PCP. Nestes eventos o PCP nunca se ass<strong>um</strong>e como tal. Em vez<br />

disso, encomenda a trezentas organizações – do tipo Organização das Mulheres do Sudoeste<br />

Alentejano ou Sindicato dos Professores do Sul, Ilhas e Arredores – a convocação.<br />

Representantes das ditas gastam horas a proferir discursos vazios. E o povo – para não falar da<br />

comunicação social – não lhes liga nenh<strong>um</strong>a. Fazem muitíssimo bem. Enquanto o PCP<br />

continuar a querer ser o lí<strong>de</strong>r clan<strong>de</strong>stino <strong>de</strong> tudo o que <strong>é</strong> movimentação, eu não vou. É coisa<br />

velha, rançosa, inútil, contraproducente. E morta. Para enterros, bastam os das pessoas<br />

próximas. Não preciso <strong>de</strong> ir aos dos estranhos.<br />

111

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!