13.04.2013 Views

Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

N M – Raça <strong>é</strong> o mesmo que etnia?<br />

MVA – Não. Do ponto <strong>de</strong> vista das Ciências Sociais o conceito <strong>de</strong> grupo <strong>é</strong>tnico apareceu <strong>de</strong>pois<br />

do <strong>de</strong> raça. A i<strong>de</strong>ia era ultrapassar as teorias raciológicas, que na altura – nos anos vinte – já<br />

eram vistas como racistas, com <strong>um</strong>a i<strong>de</strong>ia muito simples: em termos físicos duas pessoas<br />

divergem mais entre si que a m<strong>é</strong>dia <strong>de</strong> duas supostas raças e isso não serve do ponto <strong>de</strong> vista<br />

científico para classificar <strong>um</strong>a realida<strong>de</strong>. Foi o momento em que se mudou a explicação da<br />

evolução h<strong>um</strong>ana do ponto <strong>de</strong> vista da raça para o da cultura, do saber, dos modos <strong>de</strong> fazer<br />

transmitidos por <strong>um</strong> grupo h<strong>um</strong>ano e que passou a ser o crit<strong>é</strong>rio explicativo para a diferença<br />

cultural e para a diferença linguística e das maneiras <strong>de</strong> viver dos povos. A forma que se usou<br />

para <strong>de</strong>finir cada grupo separado que era sujeito a análise passou a ser grupo <strong>é</strong>tnico o que, em<br />

sentido antropológico, significa grupo “com <strong>um</strong>a cultura”.<br />

NM – Grupo separado pelo quê?<br />

MVA – Exactamente: hoje, nem sequer aceitamos essa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que há grupos separados.<br />

Porque a Antropologia e as outras ciências são inventadas a partir do Oci<strong>de</strong>nte, <strong>de</strong>senvolvidas<br />

na expansão e no colonialismo europeu. E todas as classificações que foram cunhadas para<br />

<strong>de</strong>finir essas unida<strong>de</strong>s h<strong>um</strong>anas – tribo, linhagem, grupo <strong>é</strong>tnico – são hoje vistas como produtos<br />

<strong>de</strong> <strong>um</strong> processo exclu<strong>de</strong>nte.<br />

N M – Fala da distinção entre o ponto <strong>de</strong> vista da ciências e do senso com<strong>um</strong>, e <strong>de</strong> como a<br />

noção <strong>de</strong> raça pertence ao segundo, mas essa visão não <strong>é</strong> pacífica na comunida<strong>de</strong> científica. Há<br />

extensas e muito recentes teorias sobre as “diferenças raciais” e at<strong>é</strong> quem, como alguns<br />

cientistas alemães, an<strong>de</strong> a medir crânios para estabelecer distinções entre alemães, turcos e...<br />

portugueses.<br />

MVA – Sim, mas a meu ver são “maus” cientistas. On<strong>de</strong> se avaliam as coisas <strong>é</strong> no <strong>de</strong>bate<br />

interno e esses casos são todos <strong>de</strong> enorme pol<strong>é</strong>mica no mundo científico. Estamos a entrar n<strong>um</strong>a<br />

fase parecida com a do <strong>de</strong>terminismo biológico do s<strong>é</strong>culo XIX. Agora temos a i<strong>de</strong>ologia do<br />

<strong>de</strong>terminismo gen<strong>é</strong>tico, que <strong>é</strong> a <strong>de</strong> que existe algures <strong>um</strong> código escondido que explica as<br />

diferenças sociais. Politicamente <strong>é</strong> o mesmo só que com outro nível <strong>de</strong> sofisticação.<br />

NM – As ciências têm <strong>um</strong>a gran<strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> raças <strong>de</strong>finidas a partir da cor<br />

da pele, do formato do nariz, da textura do cabelo, do tamanho do crânio.<br />

MVA – Uma das coisas mais interessantes nesses sistemas <strong>de</strong> classificação das raças que<br />

criaram <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o s<strong>é</strong>culo XIX <strong>é</strong> serem todos contraditórios entre si. Cada indivíduo impõe <strong>um</strong><br />

sistema diferente do outro. O que acontece <strong>é</strong> que vai haver graus diferentes <strong>de</strong> mist<strong>é</strong>rio:<br />

primeiro os aspectos fisicos, <strong>de</strong>pois a seguir, com a <strong>de</strong>scoberta do factor Rhesus, das tipologias<br />

diferentes do sangue. Há a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que se está a chegar “mais fundo”, característica <strong>de</strong> <strong>um</strong>a<br />

forma <strong>de</strong> pensar tipicamente oci<strong>de</strong>ntal, <strong>de</strong> procurar a “verda<strong>de</strong>” nas instâncias mais recônditas.<br />

E agora que há a possibilida<strong>de</strong> tecnológica <strong>de</strong> chegar ao mais recôndito da composição do corpo<br />

h<strong>um</strong>ano, alg<strong>um</strong>as pessoas sentem que po<strong>de</strong>m voltar a estas velhas agendas <strong>de</strong> procurar o<br />

<strong>de</strong>terminismo para certo tipo <strong>de</strong> coisas.<br />

NM – Não existindo <strong>um</strong> plebiscito a todos os cientistas sobre esta questão, não <strong>é</strong> possível<br />

afirmar que o termo raça não <strong>é</strong> válido do ponto <strong>de</strong> vista científico.<br />

MVA – Pois, não há plebiscitos em ciência, e existe o f<strong>é</strong>tiche <strong>de</strong> que a ciência <strong>é</strong> a verda<strong>de</strong>. Há<br />

várias coisas que se <strong>de</strong>viam ensinar na escola. Uma <strong>de</strong>las <strong>é</strong> enten<strong>de</strong>r a ciência como prática<br />

social exercida por pessoas com origens sociais concretas, interesses, agendas, instituições,<br />

subsídios, etc. E com i<strong>de</strong>ologias e formas <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r o mundo. Po<strong>de</strong>-se simplificar isto dizendo<br />

que há cientistas <strong>de</strong> direita e <strong>de</strong> esquerda, ou que há cientistas que acreditam que o mundo foi<br />

criado por <strong>um</strong> <strong>de</strong>us e outros que não.<br />

NM – Precisamente, em variadíssimos estudos que têm sido efectuados nos EUA no que<br />

respeita ao Quociente <strong>de</strong> Inteligência (QI) <strong>de</strong> negros e brancos, constata-se sempre que o dos<br />

primeiros <strong>é</strong> inferior ao dos segundos. E estudos efectuados em África permitem inferir o atraso<br />

242

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!