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Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

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do que <strong>um</strong>a) ban<strong>de</strong>ira americana. O pensamento crítico parece ter sido suspenso por tempo<br />

in<strong>de</strong>finido: <strong>é</strong> assim que <strong>é</strong> possível aceitar ter como presi<strong>de</strong>nte <strong>um</strong> vegetal cretino (digamos, <strong>um</strong><br />

repolho, por oposição a <strong>um</strong>a cenoura, vegetal que sempre tem <strong>um</strong>a certa dignida<strong>de</strong>); <strong>é</strong> assim que<br />

<strong>é</strong> possível ningu<strong>é</strong>m reagir aos anúncios constantes <strong>de</strong> <strong>um</strong>a guerra com (ou melhor, sobre) o<br />

Iraque; <strong>é</strong> assim que <strong>é</strong> possível aceitar as medidas securitárias sobre viajantes, sobre a internet,<br />

sobre os transeuntes, sobre toda a gente. No meio disto tudo, o mais doloroso foi verificar que<br />

existe <strong>um</strong> “clima” que impe<strong>de</strong> a conversa franca sobre estes assuntos. Instala-se a auto-censura,<br />

por receio <strong>de</strong> ferir susceptibilida<strong>de</strong>s – mesmo as daqueles que antes tinham <strong>um</strong> discurso crítico<br />

sobre o seu país.<br />

Se a isto se juntar a agudização <strong>de</strong> <strong>um</strong>a outra velha tendência americana – <strong>de</strong> raiz puritana e<br />

utópica – no sentido do controlo dos comportamentos julgados “maus” (e a insanida<strong>de</strong> antitabagista<br />

será o melhor exemplo disso), o caldo resultante <strong>é</strong> assustador. É, pelo menos, o<br />

suficiente para pôr <strong>de</strong> lado qualquer projecto <strong>de</strong> voltar para lá: seria incapaz <strong>de</strong> viver n<strong>um</strong> sítio<br />

on<strong>de</strong> pessoas supostamente inteligentes ten<strong>de</strong>m a acreditar n<strong>um</strong> m<strong>é</strong>dico que lhes diz que o<br />

cheiro a tabaco na roupa e cabelo po<strong>de</strong> prejudicar a saú<strong>de</strong> do seu filho, ao mesmo tempo que <strong>um</strong><br />

analfabeto do Texas po<strong>de</strong> exterminar quem quiser em qualquer parte do globo.<br />

Politicamente, que significa tudo isto? Basicamente, que o 11 <strong>de</strong> Setembro estabeleceu a<br />

unilateralida<strong>de</strong> absoluta dos EUA, no campo da política internacional, assim como, no plano<br />

cultural interno, ajudou a reforçar as tendências puristas e patrióticas. O que aí vem não se<br />

anuncia bom: pela primeira vez, os EUA vão atacar o Iraque sem precisarem <strong>de</strong> autorização da<br />

ONU, e dispensando aliados europeus ( a não ser o 51º Estado da União, o Reino Unido). Ao<br />

mesmo tempo recusam o Tribunal Penal Internacional, assim como recusam os protocolos <strong>de</strong><br />

Quioto. É <strong>de</strong> esperar que esta nova forma <strong>de</strong> imperialismo traga consigo os seus sub-produtos<br />

culturais: puritanismos e securitarismos, que irão <strong>de</strong> coisas aparentemente menores como a<br />

paranóia anti-tabagista (ao mesmo tempo que nenh<strong>um</strong>a paranóia anti-poluição <strong>é</strong> promovida...)<br />

at<strong>é</strong> coisas maiores, como a <strong>de</strong>finição simplista <strong>de</strong> quem <strong>é</strong> <strong>um</strong> inimigo perigoso (o terrorista real,<br />

o terrorista potencial na pessoa <strong>de</strong> esquerda e, por fim, o próprio ser-se <strong>de</strong> esquerda como<br />

anátema).<br />

Provavelmente o ditado mexicano mais conhecido <strong>é</strong> aquele que reza assim: “Pobre M<strong>é</strong>xico, tão<br />

longe <strong>de</strong> Deus e tão perto dos Estados Unidos”. Há qualquer coisa <strong>de</strong> incorrecto neste ditado: <strong>é</strong><br />

que o imperialismo americano vai junto com <strong>um</strong>a forte crença na proximida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Deus (“One<br />

Nation un<strong>de</strong>r God”; “In God we trust”; “So help me God”, etc). Não me admiraria que, ao<br />

fundamentalismo islâmico se viesse a opor <strong>um</strong> fundamentalismo cristão à americana, como<br />

combustível <strong>de</strong> <strong>um</strong>a nova política imperial. Um dia ainda estaremos todos a dizer: “Pobre<br />

Mundo, tão perto <strong>de</strong> Deus e dos Estados Unidos”. Pela parte que me toca, vou continuar a<br />

manter a minha distância em relação a Deus. E vou distanciar-me <strong>um</strong> bocado mais dos Estados<br />

Unidos.<br />

“These are a few of my favourite things...”<br />

(Webpage, 5.09.02)<br />

Quem, como eu, passou a vida inteira em escolas (dito assim, at<strong>é</strong> parece <strong>um</strong>a vida triste...), sabe<br />

a importância simbólica que tem a “rentr<strong>é</strong>e”. É no começo do famigerado “ano lectivo” que se<br />

fazem balanços e tomam <strong>de</strong>cisões. O aniversário, o Ano Novo (e, já agora, o Ano Fiscal...) são<br />

remetidos para a garridice das crendices populares ou para o cinzento da burocracia. <strong>Este</strong> ano<br />

não foi marcado apenas pela <strong>de</strong>silusão com os EUA e a confirmação <strong>de</strong> que agora vivemos<br />

n<strong>um</strong>a or<strong>de</strong>m unipolar perigosa (ou a confirmação dolorosa <strong>de</strong> que, sim, o nosso país está a ser<br />

governado por Paulo Portas). Coisas boas foram criadas e divulgadas – e tive a sorte <strong>de</strong> ter<br />

cons<strong>um</strong>ido alg<strong>um</strong>as <strong>de</strong>las.<br />

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