Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida
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salazarista – <strong>é</strong> que não se vai lá com guerra. O que a Europa está morta <strong>de</strong> saber <strong>é</strong> que qualquer<br />
ataque maluco dos EUA resulta – <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> as tropas regressarem a casa para <strong>de</strong>sfiles<br />
patrióticos e <strong>de</strong> os arg<strong>um</strong>entos <strong>de</strong> Hollywood começarem a ser escritos – em a factura ser paga<br />
por ela: em ajuda, em manutenção <strong>de</strong> paz, em imigração.<br />
O 11 <strong>de</strong> Setembro teve importância. Deu início a <strong>um</strong>a fase <strong>de</strong> hegemonia unilateral e arbitrária.<br />
Quando há <strong>um</strong>as d<strong>é</strong>cadas atrás <strong>um</strong> comando terrorista palestiniano assassinou atletas israelitas<br />
nos Jogos Olímpicos <strong>de</strong> Munique, foi igualmente <strong>um</strong> golpe simbólico terrível (terrorismo<br />
“islâmico” no Oci<strong>de</strong>nte e durante o ritual pacifista dos Jogos Olímpicos). Começou então a<br />
<strong>é</strong>poca dos <strong>de</strong>svios <strong>de</strong> aviões, e provavelmente nunca houve tanto terrorismo como então. Isto<br />
para dizer que o surto <strong>de</strong> terrorismo actual não <strong>é</strong> mais nem menos – e <strong>é</strong> igualmente horrível – do<br />
que o que tem havido <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que o conflito israelo-árabe começou. O que temos <strong>de</strong><br />
verda<strong>de</strong>iramente novo <strong>é</strong> a oportunida<strong>de</strong>: sem União Sovi<strong>é</strong>tica, com <strong>um</strong>a Europa mais unida e<br />
forte, com <strong>um</strong> Israel radicalizado à direita, e com <strong>um</strong>a i<strong>de</strong>ologia do “laissez-faire” levada ao<br />
extremo, o complexo militar-industrial americano sente-se à-vonta<strong>de</strong> para fazer o que quiser.<br />
Um ano <strong>de</strong>pois dos ataques terroristas, e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 3000 mortos inocentes, os EUA preparam-se<br />
para invadir o Iraque. Eis a lista dos apoios que conseguiram at<strong>é</strong> agora: o governo israelita <strong>de</strong><br />
direita; a insular Inglaterra na pessoa do homem-que-<strong>de</strong>struiu-o-socialismo-<strong>de</strong>mocrático; muito<br />
provavelmente Berlusconi; e o senhor Durão Barroso Oliveira da Figueira, a quem Bush trata<br />
carinhosamente (?) pelo hispânico nome <strong>de</strong> “Hos<strong>é</strong>”.<br />
Entretanto, Bin La<strong>de</strong>n anda à solta, o Afeganistão lá ficou esquecido nas suas lutas tribais, Israel<br />
prepara-se para construir <strong>um</strong> Muro <strong>de</strong> Berlim com a Palestina, nada indica que o terrorismo<br />
tenha sido controlado, e o petróleo fluirá barato para os reservatórios dos carros dos americanos,<br />
“so help them God”. No meio disto tudo, Bush anda à solta. E os meninos bem comportados da<br />
colónia <strong>de</strong> Portugal, quais indígenas <strong>de</strong>sejosos <strong>de</strong> serem assimilados, aplau<strong>de</strong>m. Volta, Clinton,<br />
estás perdoado!<br />
Três oportunida<strong>de</strong>s, três<br />
(Webpage, 12.09.02)<br />
Gran<strong>de</strong> parte da minha vida tem sido vivida <strong>de</strong>pois do 25 <strong>de</strong> Abril <strong>de</strong> 1974. Passei pelo golpe,<br />
passei pela tentativa <strong>de</strong> revolução que se seguiu, passei pela “normalização” (o “25 <strong>de</strong><br />
Novembro”), passei pela a<strong>de</strong>são <strong>de</strong> Portugal à União Europeia, passei pelo Cavaquismo, passei<br />
pelo PS no governo e <strong>de</strong>semboco, agora, na entrada no Euro e no governo Barroso-Portas.<br />
Qualquer <strong>um</strong>a <strong>de</strong>stas coisas <strong>é</strong> infinitamente melhor do que a hipótese <strong>de</strong> ter continuado a viver<br />
naquela coisa obscura anterior a 1974. Mas qualquer <strong>um</strong>a <strong>de</strong>stas coisas po<strong>de</strong>ria facilmente ter<br />
sido mais rica e produtiva para o país e para todos nós do que foi. A sensação que hoje tenho <strong>é</strong><br />
<strong>de</strong> sucessivas oportunida<strong>de</strong>s perdidas. Ando pelas ruas e continuo a ver os mesmos sinais (<strong>é</strong><br />
nesses sinais que se entrevê o estado das coisas, mais do que nas análises profundas) <strong>de</strong> atraso,<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>sleixo e <strong>de</strong>pendência, <strong>de</strong> coisa obscura e marginal que caracteriza o pior <strong>de</strong> Portugal (rima<br />
e tudo, mas isso <strong>é</strong> <strong>um</strong>a característica nacional): o pó e as obras, o caos do trânsito e o<br />
comportamento animal dos condutores, os carros nos passeios e as pessoas a cuspir, a feiura da<br />
“arquitectura” nova e do “urbanismo”, lado a lado com a lepra dos pr<strong>é</strong>dios antigos, a ignorância,<br />
o autoritarismo, o quase-analfabetismo, a crispação e o stress, Fátima, futebol e preconceito.<br />
Foram três as oportunida<strong>de</strong>s perdidas: a da <strong>de</strong>mocracia (que se po<strong>de</strong>ria simbolizar na<br />
oportunida<strong>de</strong> perdida do 25 <strong>de</strong> Abril); a do <strong>de</strong>senvolvimento (simbolizada pela a<strong>de</strong>são à União<br />
Europeia); e a da igualda<strong>de</strong>, correspon<strong>de</strong>nte ao governo do PS que tivemos at<strong>é</strong> há pouco.<br />
Quanto à <strong>de</strong>mocracia, porquê e como per<strong>de</strong>mos a oportunida<strong>de</strong>? Circunstâncias históricas à<br />
parte, a esquerda portuguesa não se portou bem no período a seguir ao 25 <strong>de</strong> Abril. Não sou<br />
daqueles que choram aqueles tempos por acharem que não se conseguiu fazer a Revolução. Pelo<br />
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