Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida
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qualquer <strong>de</strong>cisão do governo dos EUA po<strong>de</strong>ria conduzir-nos a <strong>um</strong> mundo on<strong>de</strong> não só o<br />
fundamentalismo e o terrorismo continuariam a existir, como a nossa <strong>de</strong>mocracia po<strong>de</strong>ria ser<br />
cerceada por políticas securitárias e <strong>de</strong> excepção. Isto não <strong>é</strong> <strong>de</strong>missionismo. É pensar quando <strong>é</strong><br />
mais difícil e necessário fazê-lo.<br />
Carta ao Director do Público<br />
(25.10.01)<br />
No editorial do “Público” <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> Outubro, Jos<strong>é</strong> Manuel Fernan<strong>de</strong>s tem a franqueza <strong>de</strong> explicar<br />
o que <strong>é</strong> que lhe vem interessando verda<strong>de</strong>iramente no <strong>de</strong>bate suscitado pelos atentados<br />
terroristas <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> Setembro e pela reacção dos EUA aos mesmos. Trata-se da actualização <strong>de</strong><br />
“velhas divisões” entre os partidários da “socieda<strong>de</strong> aberta” e os supostos inimigos da mesma.<br />
Sem dúvida que situações como a actual extremam os campos. Mas esse <strong>é</strong> justamente <strong>um</strong> dos<br />
mais perigosos efeitos do terrorismo e da guerra, a que <strong>um</strong> director <strong>de</strong> jornal <strong>de</strong>veria resistir.<br />
Gostaria <strong>de</strong> perturbar o esquema simplificador <strong>de</strong> JMF com o meu caso pessoal – apenas por ser<br />
o que conheço melhor. Des<strong>de</strong> logo, a questão do anti-americanismo: não só vivi vários anos nos<br />
EUA, como consi<strong>de</strong>ro aquele país a minha segunda pátria e quase todas as minhas referências<br />
culturais vêm <strong>de</strong> lá. Isso não me torna americanista primário, assim como as convicções <strong>de</strong><br />
esquerda não me tornam anti-americanista. A divisão simplista po<strong>de</strong> JMF <strong>de</strong>smontá-la se ler o<br />
artigo principal do último número da “New York Review of Books”, no qual Phillip Wilcox –<br />
que foi Embaixador Especial dos EUA para o Contraterrorismo entre 1994 e 1997 – critica a<br />
estrat<strong>é</strong>gia dos EUA por ser inútil e contraproducente. Pessoa mais afastada do campo antisocieda<strong>de</strong><br />
aberta não po<strong>de</strong>ria haver.<br />
Mas há mais. O fim do bloco “socialista” não foi necessariamente <strong>um</strong>a catástrofe para a<br />
esquerda. Para muitos <strong>de</strong> nós foi <strong>um</strong>a benesse. Ser <strong>de</strong> esquerda e estar contra esta guerra não <strong>é</strong><br />
necessariamente sinónimo <strong>de</strong> ser “revolucionário”: consi<strong>de</strong>ro-me <strong>um</strong> reformista radical,<br />
<strong>de</strong>fensor da <strong>de</strong>mocracia e <strong>de</strong>sconfio da irracionalida<strong>de</strong> utópica; mas não me <strong>de</strong>ixo embalar pelo<br />
engodo i<strong>de</strong>ológico d<strong>um</strong>a “socieda<strong>de</strong> aberta” cuja tendência <strong>é</strong> para fechar a porta a cada vez mais<br />
gente. Se há alg<strong>um</strong>a coisa que <strong>de</strong>sejaria ver “superada”, não <strong>é</strong> a <strong>de</strong>mocracia nem o mercado,<br />
mas sim o uso i<strong>de</strong>ológico <strong>de</strong>stas expressões para continuar, atrav<strong>é</strong>s <strong>de</strong> práticas como a guerra, a<br />
excluir <strong>de</strong> ambos populações inteiras.<br />
Suspeito que JMF gostaria <strong>de</strong> ter <strong>um</strong>a situação em que a esquerda apoiasse Bin La<strong>de</strong>n e os<br />
outros sectores fossem os paladinos da <strong>de</strong>mocracia e da justiça. Azar seu: acontece que muitos<br />
<strong>de</strong> nós achamos os Bin La<strong>de</strong>ns in<strong>de</strong>fensáveis e, ao mesmo tempo, sabemos ver, na actual<br />
situação, a continuação <strong>de</strong> mais do mesmo: a política do petróleo, a unipolarida<strong>de</strong> e a<br />
oportunida<strong>de</strong> para matar as instâncias <strong>de</strong> regulação internacional e o movimento por <strong>um</strong>a<br />
globalização alternativa. N<strong>um</strong>a das manifestações contra a guerra nos EUA, <strong>um</strong>a mulher a quem<br />
morreu <strong>um</strong> familiar nas Twin Towers empunhava <strong>um</strong> cartaz dizendo que a guerra não <strong>é</strong> solução.<br />
Tenho a certeza que, tal como eu, ela não quer acabar com o mercado e a <strong>de</strong>mocracia, não quer<br />
acabar com Israel, nem tolera o fundamentalismo A obsessão com as “velhas divisões” parece<br />
ter mais sucesso em Portugal do que noutros países. Porque será?<br />
O meu filho <strong>é</strong> homossexual. E agora?<br />
(Jornal El GêBêEtê, 2003)<br />
Você criou o seu filho com amor e carinho. Por vezes sacrificou-se, para lhe dar a melhor<br />
educação possível. É provável que você tenha visto o seu filho como <strong>um</strong> prolongamento <strong>de</strong> si e<br />
tenha <strong>de</strong>sejado para ele <strong>um</strong>a vida <strong>de</strong> felicida<strong>de</strong> e sucesso, nos planos amoroso, familiar,<br />
profissional e social. Mas com certeza você tamb<strong>é</strong>m pensou muitas vezes em como o seu filho <strong>é</strong><br />
<strong>um</strong> indivíduo com vida própria ou como as escolhas <strong>de</strong>le po<strong>de</strong>m ser diferentes das suas (por<br />
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