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Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

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quer dizer, Casa Gran<strong>de</strong> e Senzala começa com <strong>um</strong> discurso sobre sexualida<strong>de</strong>. Digamos que a<br />

figura... o equivalente mitificado da mulata brasileira <strong>é</strong> <strong>um</strong>a mulata, mas <strong>é</strong> outra coisa, tem<br />

traços fisionômicos “negros”, olhos azuis ou ver<strong>de</strong>s e cabelo crespo ligeiramente loiro,<br />

supostamente <strong>de</strong>vido à presença histórica <strong>de</strong> holan<strong>de</strong>ses, flamengos, ju<strong>de</strong>us e ingleses. Então a<br />

mitificação, no senso com<strong>um</strong> português e caboverdiano, da figura da mulata caboverdiana <strong>é</strong> <strong>um</strong><br />

discurso sobre “objetos insólitos”, essas flores do colonialismo...<br />

Adriana – Uma última pergunta, para encerrar, sobre o futuro dos estudos <strong>de</strong> gênero. Eu acho<br />

que o impulso não está na categoria <strong>de</strong> gênero, mas nos estudos feministas. Talvez para você<br />

esteja nos gay studies, isso não importa. O que sim <strong>é</strong> importante <strong>é</strong> que são essas perspectivas<br />

políticas, fora [das disciplinas] as que provocam toda essa efervescência. Não sei se a categoria<br />

<strong>de</strong> gênero veio para valer. Muitas autoras a abandonaram. Donna Haraway <strong>é</strong> <strong>um</strong>a das que a<br />

questionam. Há pessoas que pensam que, no futuro, as inovações estarão associadas ao trabalho<br />

a partir do corpo. Não sei, mas acredito que todo esse estímulo, essa movimentação intelectual<br />

parte <strong>de</strong>ssas perspectivas políticas que atravessam as disciplinas. Você acha que gênero <strong>é</strong> <strong>um</strong>a<br />

categoria que permanecerá, que terá o <strong>de</strong>stino da “classe”?<br />

Mariza – que vai ter <strong>um</strong> rendimento teórico...<br />

<strong>Miguel</strong> – Eu acho que sim, resta saber como ela será integrada na teoria social em geral, por<br />

enquanto não foi...<br />

Entrevista. <strong>Miguel</strong> <strong>Vale</strong> <strong>de</strong> <strong>Almeida</strong>. DNA, Diário <strong>de</strong> Notícias, 29.05.99. Por Anabela Mota<br />

Ribeiro.<br />

Do gabinete, <strong>de</strong> pare<strong>de</strong>s claras e rectangulares, vê-se <strong>um</strong> recanto semeado <strong>de</strong> relva para on<strong>de</strong> se<br />

dirigiu <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> acabada a conversa. Avançava pelos corredores, <strong>de</strong>scia ou subia escadas,<br />

quando comentou: “Não tinha falado logo no ISCTE por causa disto”. E por isto, <strong>de</strong>signava <strong>um</strong>a<br />

jornalista com <strong>um</strong> gravador saciado e <strong>um</strong> fotógrafo com máquinas ao <strong>de</strong>penduro. E, sobretudo,<br />

as pessoas a olharem e a assistirem ao cortejo. A conversa esteve para ser n<strong>um</strong> restaurante do<br />

Bairro Alto. Depois eu pedi <strong>um</strong> espaço mais intimista. Abancámos na secretária, com a janela<br />

para o ver<strong>de</strong> em frente e <strong>um</strong> mapa do antigo Portugal ainda ilustrado com as províncias<br />

ultramarinas. Ele pediu <strong>de</strong>sculpa pela eventualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> algu<strong>é</strong>m irromper pelo gabinete. À boa<br />

moda portuguesa, há muito quem entre e <strong>de</strong>pois bata. Façam favor <strong>de</strong> entrar. <strong>Miguel</strong> <strong>Vale</strong> <strong>de</strong><br />

<strong>Almeida</strong> <strong>é</strong> antropólogo. A partir dos olhos <strong>de</strong>le, vemos Portugal e o mundo em tempo <strong>de</strong><br />

mudança. Do que sentem e fazem as pessoas, para lá das respostas convenientes às estatísticas.<br />

Um cientista <strong>de</strong> pessoas, tamb<strong>é</strong>m pulverizado na intervenção cívica e na ficção literária. Por<br />

acaso tamb<strong>é</strong>m <strong>é</strong> homossexual. Embora, como explica adiante, não seja o centro da sua<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />

– O que <strong>é</strong> que <strong>de</strong>fine <strong>um</strong>a boa educação?<br />

– Para já, o clássico: bons pais e boa escola.<br />

– E companhias?<br />

– Sim, mas acabamos por escolhê-las por causa da educação que tivemos. Para mim, foram os<br />

meus pais e a escola on<strong>de</strong> an<strong>de</strong>i, primária e preparatória, sobretudo. No liceu já foi <strong>um</strong> caos.<br />

– Como foram esses primeiros seis anos e porque <strong>é</strong> que foram marcantes?<br />

– Era <strong>um</strong> col<strong>é</strong>gio privado <strong>de</strong> raparigas chamado Santa Joana, a Princesa, que não tinha licença<br />

<strong>de</strong> ter ensino misto. Éramos só seis rapazes e estávamos treinados para nos escon<strong>de</strong>rmos se<br />

aparecesse o inspector escolar.<br />

– Não <strong>de</strong>baixo da saia das meninas, pres<strong>um</strong>o.<br />

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