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Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida

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julgamento dos terroristas contribuirá para <strong>um</strong>a nova or<strong>de</strong>m mundial se, ao mesmo tempo,<br />

forem dados passos <strong>de</strong>cisivos para a resolução das causas remotas <strong>de</strong>ste caos: <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, a<br />

resolução do problema palestiniano. Tudo o resto – “America’s new war” – po<strong>de</strong>rá satisfazer<br />

apenas <strong>um</strong> compreensível <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> vingança. Po<strong>de</strong>rá, quando muito, apaziguar os nossos<br />

medos por alguns meses. Mas não só não resolverá nada, como não parará o terror a que<br />

milhões <strong>de</strong> pessoas no mundo não-oci<strong>de</strong>ntal têm sido sujeitas. Se sempre foi verda<strong>de</strong> que a<br />

escalada <strong>de</strong> violência só gera mais violência, imagine-se o que nos espera quando <strong>um</strong>a das<br />

partes <strong>é</strong> o terrorismo que <strong>de</strong>svia aviões com armas brancas. O que não <strong>de</strong>vemos nem po<strong>de</strong>mos<br />

<strong>de</strong>ixar acontecer <strong>é</strong> que o 11 <strong>de</strong> Setembro seja a <strong>de</strong>sculpa i<strong>de</strong>al para o Governo dos EUA garantir<br />

militarmente o que tem vindo a (<strong>de</strong>s)fazer na política e na economia globais.<br />

Tempos Difíceis<br />

(“Público”, 04.10.01)<br />

Primeiro foram os atentados terroristas <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> Setembro. Depois, o <strong>de</strong>bate sobre a nova<br />

“or<strong>de</strong>m” internacional emergente. Mas na periferia do Imp<strong>é</strong>rio há <strong>um</strong> terceiro acontecimento: o<br />

ajuste <strong>de</strong> contas com a esquerda que, após a libertação do “socialismo (sur)real” com a queda do<br />

muro <strong>de</strong> Berlim, tem vindo a opor-se à globalização capitalista e às políticas neo-liberais dos<br />

Estados. Muitos articulistas portugueses <strong>de</strong>dicam-se a “<strong>de</strong>monstrar” que toda e qualquer<br />

tentativa <strong>de</strong> pensar o mundo <strong>é</strong> <strong>um</strong>a forma encoberta <strong>de</strong> justificação do atentado.<br />

<strong>Este</strong> tipo <strong>de</strong> “arg<strong>um</strong>ento” <strong>é</strong> <strong>de</strong>magógico e preconceituoso porque mete no mesmo saco os d<strong>é</strong>beis<br />

mentais que se regozijam com o atentado, e quem tenta pensar para melhor agir. A primeira<br />

estrat<strong>é</strong>gia retórica <strong>de</strong>stes articulistas <strong>é</strong> atribuir sempre <strong>um</strong>a intenção oculta aos adversários:<br />

algu<strong>é</strong>m que ponha em causa a retaliação estará sempre do lado dos terroristas. A segunda <strong>é</strong> a<br />

atribuição <strong>de</strong> fraqueza moral aos críticos da hegemonia americana: no fundo, <strong>de</strong>sejam a<br />

passivida<strong>de</strong> e não têm a coragem <strong>de</strong> ass<strong>um</strong>ir os custos <strong>de</strong> <strong>um</strong>a intervenção militar. A terceira <strong>é</strong> a<br />

utilização abusiva <strong>de</strong> termos pol<strong>é</strong>micos e i<strong>de</strong>ológicos como “civilização”, <strong>um</strong> termo há muito<br />

usado pelos conquistadores para branquearem os processos <strong>de</strong> barbárie que os conduziram ao<br />

po<strong>de</strong>r. <strong>Este</strong>s comentadores <strong>de</strong>monstram <strong>um</strong>a contradição curiosa: <strong>é</strong> que, em nome da<br />

“<strong>de</strong>mocracia” e da “civilização”, só pensam no ataque armado, sem qualquer problema em<br />

admitir a espiral <strong>de</strong> violência que isso possa gerar; e não pensam politicamente sobre como<br />

(re)construir <strong>um</strong> mundo árabe e/ou islâmico que subscreva valores universais <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocracia e<br />

direitos h<strong>um</strong>anos.<br />

No meio do <strong>de</strong>lírio mais papista do que o papa, Pacheco Pereira resolveu atacar directamente o<br />

Bloco <strong>de</strong> Esquerda. Óptimo sinal. Escandaliza-se com “o modo como o BE reagiu aos atentados<br />

terroristas”, mas não diz nada sobre o conteúdo <strong>de</strong>ssas reacções. De modo a esclarecer os<br />

leitores – pois o BE, ao contrário do que diz PP, não tem espaço reservado nos jornais – que<br />

fique claro o seguinte: 1) O BE reagiu na primeira hora dizendo que os terroristas não<br />

representam os oprimidos <strong>de</strong>ste mundo e que o terrorismo não <strong>é</strong> <strong>um</strong>a forma legítima <strong>de</strong> acção;<br />

2) o BE advertiu, com base na experiência do passado e à semelhança <strong>de</strong> muita gente nos EUA,<br />

para os perigos <strong>de</strong> <strong>um</strong>a reacção americana que perpetue a espiral <strong>de</strong> violência (curiosamente, o<br />

governo americano parece estar a levar isto em conta, mesmo que a intenção possa ser o<br />

aprofundamento da hegemonia); 3) o BE, como partido político, não se <strong>de</strong>mitiu nem se <strong>de</strong>mitirá<br />

<strong>de</strong> contextualizar os acontecimentos nos termos <strong>de</strong> <strong>um</strong>a crítica da globalização capitalista e do<br />

papel dos EUA.<br />

Não tenho a menor dúvida que a <strong>de</strong>mocracia oci<strong>de</strong>ntal tal como a conhecemos, com os seus<br />

<strong>de</strong>feitos e limitações, <strong>é</strong> infinitamente melhor do que o projecto (ou a falta <strong>de</strong>le) <strong>de</strong> terroristas ou<br />

fundamentalistas. Assim como não tenho a menor dúvida que o nosso sistema tem negado ao<br />

resto do mundo o usufruto da <strong>de</strong>mocracia e das condições socio-económicas para o seu<br />

exercício. É por isso que, aparte a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> punir os autores e instigadores dos atentados,<br />

tudo o resto – como punir e o que fazer a seguir – está em aberto. Dar carta branca a toda e<br />

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