Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida
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MVA – A principal forma <strong>de</strong> expressão dos afro-brasileiros no espaço público <strong>é</strong> cultural. Não <strong>é</strong>,<br />
ainda, política no sentido estrito, como movimento <strong>de</strong> reivindicação dos direitos. E essa <strong>é</strong> a sua<br />
gran<strong>de</strong> vantagem e o seu gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>feito. Vantagem, porque leva as coisas afrobrasileiras para o<br />
espaço público com muito mais força; <strong>de</strong>feito, porque não permite mobilização <strong>de</strong> consciência<br />
política, as pessoas pensam que estão a fazer apenas aquilo que <strong>é</strong> parte da sua maneira <strong>de</strong> ser. O<br />
que ultimamente tem acontecido – e isso <strong>é</strong> novo – <strong>é</strong> que há <strong>um</strong>a união muito interessante entre<br />
alguns sectores bastante politizados, à americana, as pessoas que participam nos blocos afro e os<br />
terreiros <strong>de</strong> candombl<strong>é</strong>, que têm tido <strong>um</strong> ressurgimento estrondoso.<br />
DN – Foi há dias ao Brasil mostrar o doc<strong>um</strong>entário às pessoas que nele participam. Elas<br />
gostaram?<br />
MVA – Bastante. Apropriaram-se <strong>de</strong>le imediatamente. Isso satisfez-me muito, porque a<br />
intenção do doc<strong>um</strong>entário tamb<strong>é</strong>m tinha a ver com o ter <strong>um</strong> produto para <strong>de</strong>volver às pessoas.<br />
Elas perceberam isso e disseram: “Isto <strong>é</strong> mesmo o que precisamos para po<strong>de</strong>rmos mostrar o que<br />
aqui em Ilh<strong>é</strong>us se tenta escon<strong>de</strong>r”, em termos das questões político-raciais.<br />
DN – Mas não acha que eles gostaram porque julgam que está a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r as suas posições?<br />
MVA – Eu estou a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a posição <strong>de</strong>les. Como antropólogo, consigo apontar no que fazem<br />
o que <strong>é</strong> <strong>um</strong> processo <strong>de</strong> construção imaginária da sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Mas tamb<strong>é</strong>m sei medir o que<br />
são relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r – e sei que aquelas pessoas estão mais <strong>de</strong>smunidas <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r que os que<br />
lhes dão problemas. Isso para mim <strong>é</strong> <strong>um</strong>a questão <strong>é</strong>tica fundamental, e não me perturba, como<br />
antropólogo, tomar posição. Ser antropólogo <strong>é</strong> <strong>um</strong>a profissão, não <strong>é</strong> <strong>um</strong> sacerdócio. Antes <strong>de</strong><br />
tudo, sou cidadão.<br />
DN – Toda a antropologia tem <strong>um</strong>a dimensão política?<br />
MVA – Tem, quer se queira quer não. E, no meu caso, sempre achei que seria melhor ass<strong>um</strong>i-lo.<br />
Apenas temos <strong>um</strong>a responsabilida<strong>de</strong> acrescida – científica – <strong>de</strong> exaustivamente vermos se<br />
mesmo as coisas nas quais acreditamos batem certo ou não. Mas esse <strong>é</strong> <strong>um</strong> problema <strong>de</strong><br />
disciplina, ginástica mental e exigência <strong>é</strong>tica.<br />
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