Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida
Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida
Bem-vind@! Este é um “livro” - Miguel Vale de Almeida
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
1º – O movimento pró-escolha <strong>de</strong>ve ser <strong>um</strong> movimento centrado na reivindicação dos direitos<br />
das mulheres e não, como tem sido, na saú<strong>de</strong> ou na resolução <strong>de</strong> <strong>um</strong> drama social. Refiro-me ao<br />
direito ao uso do corpo e à liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolher e <strong>de</strong>cidir, incluíndo, naturalmente, o direito à<br />
saú<strong>de</strong> reprodutiva.<br />
2º – <strong>Este</strong> movimento <strong>de</strong>ve incluir outras agendas – e fazer pontes com quem com elas lida –<br />
relacionadas com a família, o g<strong>é</strong>nero e a sexualida<strong>de</strong>, bem como com a promoção <strong>de</strong> <strong>um</strong>a<br />
socieda<strong>de</strong> laica.<br />
3º – <strong>Este</strong> movimento <strong>de</strong>ve ter noções claras sobre a natureza social do Corpo e da Pessoa,<br />
opondo-se frontalmente ao discurso sobre a “Vida”. Como disse <strong>um</strong> dirigente dos Católicos pela<br />
Livre Escolha americanos: “o pensamento e conhecimento sociológico, m<strong>é</strong>dico e filosófico<br />
facilmente leva à conclusão que os fetos não são pessoas. Não são, assim, o equivalente moral e<br />
físico das mulheres em cujos corpos eles crescem”. Só assim se po<strong>de</strong>rá contrariar a crescente<br />
atenção da medicina aos fetos (e mesmo aos embriões), a sua visibilida<strong>de</strong> e a sua transformação<br />
em actores sociais virtuais – coisa que não são.<br />
4º – <strong>Este</strong> movimento <strong>de</strong>ve ass<strong>um</strong>ir claramente a <strong>de</strong>fesa da legalização do aborto assistido e<br />
gratuito e não ficar-se pela <strong>de</strong>spenalização e/ou <strong>de</strong>scriminalização.<br />
Sem título<br />
(Webpage, 1.06.02)<br />
At<strong>é</strong> há poucos dias o actual governo usava <strong>um</strong>a estrat<strong>é</strong>gia retórica que consistia em fingir que<br />
ainda não estava no po<strong>de</strong>r, mas sim em campanha: qualquer comunicado referia sempre o<br />
<strong>de</strong>scalabro em que supostamente o PS teria <strong>de</strong>ixado o país. Esta modalida<strong>de</strong> está, agora,<br />
esgotada. Em vez <strong>de</strong>la, conseguiu-se o prolongamento da sessão legislativa, <strong>de</strong> modo a coincidir<br />
com o campeonato mundial <strong>de</strong> futebol, culminando na partida para f<strong>é</strong>rias dos portugueses e das<br />
instituições. Convenhamos: <strong>é</strong> o contexto i<strong>de</strong>al para legislar “à bruta”.<br />
A brutalida<strong>de</strong> consiste n<strong>um</strong> duplo propósito: <strong>de</strong>struir tudo o que ainda exista <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocracia<br />
social, e privatizar o que ainda esteja por privatizar. É isto que veremos acontecer na segurança<br />
social e na saú<strong>de</strong>, na prestação <strong>de</strong> serviços públicos e na administração pública, nas alterações<br />
às leis do trabalho, da imigração e da nacionalida<strong>de</strong>, e por aí fora. A <strong>de</strong>struição <strong>é</strong> feita com base<br />
na cartilha neo-liberal, só que n<strong>um</strong> país on<strong>de</strong> os serviços públicos e o Estado-providência nunca<br />
se estabeleceram como <strong>de</strong>ve ser. O a<strong>um</strong>ento do IVA ou as isenções fiscais à cabeça para muitas<br />
empresas e transacções financeiras, significam remeter os custos para os contribuintes no geral.<br />
Significa socializar os prejuízos e privatizar os benefícios. O resultado será, necessariamente, o<br />
a<strong>um</strong>ento <strong>de</strong> pessoas excluídas, marginalizadas ou em situação instável n<strong>um</strong>a socieda<strong>de</strong> que não<br />
tem a flexibilida<strong>de</strong> e os níveis <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento que permitam a essas pessoas “virarem-se”.<br />
Parece irracional? Não seria <strong>de</strong> esperar que o governo tivesse medo <strong>de</strong> revoltas sociais,<br />
insegurança, instabilida<strong>de</strong>?<br />
Não. Porque a estrat<strong>é</strong>gia <strong>de</strong> direita tem dois braços: o braço que tira do domínio público para dar<br />
ao privado, e o braço que reprime a contestação. A insegurança a ser provocada pelas políticas<br />
<strong>de</strong> direita será combatida com a obsessão securitária e policial da mesma direita. Pelo meio, o<br />
apelo à calma e a solução apresentada basear-se-ão em velhos slogans: valores <strong>de</strong> obediência,<br />
valores <strong>de</strong> família, religião. O <strong>de</strong>scalabro será justificado com o <strong>de</strong>scalabro daqueles valores, e<br />
aí teremos as políticas <strong>de</strong> “apoio à família”, as aulas <strong>de</strong> “religião e moral”, a estigmatização das<br />
mulheres solteiras ou das que abortam, e por aí fora. Disso tudo se encarregará a componente<br />
que o cavaquismo não tinha: a extrema direita <strong>de</strong> Paulo Portas.<br />
<strong>Bem</strong> sei que esta visão po<strong>de</strong> parecer <strong>um</strong> pouco paranóica. Afinal <strong>de</strong> contas não tem Durão<br />
Barroso aquele ar <strong>de</strong> quem não sabe o que está a fazer? Não parece o governo ziguezaguear,<br />
119