Revista (PDF) - Universidade do Minho
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10<br />
DIACRÍTICA<br />
pelas quais o Espírito acede gradualmente à livre consciência de si.<br />
Os diferentes povos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> são o veículo duma realidade superior<br />
– o «Espírito <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>» –, que só se realiza na história e incarna-se,<br />
de cada vez, no povo que frui dum maior grau de liberdade.<br />
Hegel foi o contemporâneo atento ao que se chamou o «despertar<br />
das nacionalidades»: o nacionalismo emancipa<strong>do</strong>r universalista <strong>do</strong>s<br />
jacobinos em luta contra os monarcas, o nacionalismo identitário que<br />
se reclamava das peculiaridades fundadas na língua, segun<strong>do</strong> Herder,<br />
ou da raça segun<strong>do</strong> outros, de um Fichte que apelava aos alemães ao<br />
opor-se ao Império napoleónico, aos nacionalismos <strong>do</strong>s liberais revoltan<strong>do</strong>-se<br />
contra a Santa Aliança tradicionalista em nome de um direito<br />
universal. Foi ao mesmo tempo o filósofo <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> moderno, das suas<br />
leis, instituições e administração.<br />
Um <strong>do</strong>s tópicos das suas análises é a referência ao «Espírito de um<br />
povo», elemento histórico e social que confere a um conjunto humano<br />
a sua constância e consistência – a sua substância, para recorrermos a<br />
um conceito filosófico; a expressão é derivada de Herder, mas ela é<br />
tributária de Montesquieu, que empreendeu uma analítica <strong>do</strong> «espírito<br />
das leis», múltiplas e diversas. Conjuntamente, um outro tópico é a<br />
manifestação da essência <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, como culminância <strong>do</strong> direito, na<br />
medida em que o diz objectivamente, para além da subjectividade das<br />
paixões e <strong>do</strong>s interesses («vontades particulares» de Rousseau), exprimin<strong>do</strong><br />
a sua objectividade («vontade geral» de Rousseau). Para Hegel<br />
– recordêmo-lo! – cada povo organiza-se politicamente e identifica-se<br />
com um Esta<strong>do</strong> nacional; portanto, nada de micro-etnia no seu pensamento,<br />
pois a entidade povo identifica-se com a de nação, cuja unidade<br />
é dada pela língua, tradição, costumes, arte, cultura, religião, etc. No<br />
entanto, o hegelianismo junta à ideia herderiana <strong>do</strong> carácter original<br />
da nação o tema duma missão específica.<br />
No interior, cada Esta<strong>do</strong> está organiza<strong>do</strong> em suas esferas éticas, a<br />
família, a sociedade civil, o Esta<strong>do</strong>; ao nível da sociedade civil (sistema<br />
onde se desenrolam os interesses individuais, o trabalho e a<br />
produção), a liberdade não chega a ser o que ela é verdadeiramente;<br />
quer dizer, o económico não é a verdade <strong>do</strong> homem e é no Esta<strong>do</strong><br />
que a humanidade se realiza. O Esta<strong>do</strong> hegeliano, filho da Revolução<br />
francesa, opõe-se à feudalidade, ao arbitrário monárquico ou senhorial,<br />
aos particularismos regionais: tal como descreveu os perío<strong>do</strong>s de<br />
«totalitarismo» na história <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> (v.g., o império romano, que<br />
esmagou os indivíduos), Hegel vê no desenvolvimento da liberdade<br />
individual uma aquisição irreversível da época moderna, já anunciada<br />
pelo cristianismo na sua origem, reiterada pelo luteranismo, efectuada<br />
parcialmente pela Revolução francesa e eventos consequentes.