Revista (PDF) - Universidade do Minho
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JUSTIÇA E PODER NOS TRIBUNAIS PLENÁRIOS DO ESTADO NOVO 259<br />
crimes políticos de rebelião, composto de <strong>do</strong>is oficiais (<strong>do</strong> Exército ou<br />
da Armada, um <strong>do</strong>s quais será o presidente) e por um juiz auditor,<br />
to<strong>do</strong>s eles nomea<strong>do</strong>s pelo respectivo ministro da tutela. A criação deste<br />
tribunal – cujos membros – no dizer de José Magalhães Godinho – não<br />
se distinguiam nem pelo bom senso nem pelo saber (decidin<strong>do</strong> quase<br />
sempre a favor das propostas da polícia política, mesmo quan<strong>do</strong> as<br />
provas eram insuficientes) – mostrava, uma vez mais, o especial carinho<br />
<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Novo pelas jurisdições especiais, esperan<strong>do</strong> assim que<br />
«a ‘justiça’ se fizesse a seu contento. E não se enganava, pois nele se<br />
cometeram – como salienta o mesmo causídico mas, também, Salga<strong>do</strong><br />
Zenha, Almeida Ribeiro, Palma Carlos, Mário Castro, Gama Fernandes,<br />
entre outros – «verdadeiras enormidades jurídicas, sem o menor<br />
respeito pelas provas, e coonestan<strong>do</strong> todas as confissões extorquidas<br />
pela polícia política à sombra das maiores violências e torturas, como<br />
se sempre tivessem si<strong>do</strong> confissões espontâneas!» 34 . O Tribunal<br />
parecia não estar ali para ser isento e justo, «mas sim para passar atesta<strong>do</strong>s<br />
de bom comportamento aos agentes da PIDE e aos seus méto<strong>do</strong>s<br />
‘científicos’ de interrogar» 35 . Exemplo sintomático da cegueira<br />
deste Tribunal extraordinário é o desabafo público, no fim de um<br />
julgamento, <strong>do</strong> seu presidente, coronel Mouzinho ao grupo de advoga<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong>s argui<strong>do</strong>s: «tenho uma grande admiração pelos senhores advoga<strong>do</strong>s,<br />
falam e escrevem muito bem, sabem tu<strong>do</strong>, de divórcios, de despejos,<br />
de letras, de cheques, de crimes, de provas e confissões, e de tu<strong>do</strong> isto<br />
falam brilhantemente e com grande inteligência e saber. Eu não sei nada<br />
disso e, por isso, pela jurisprudência das cautelas, única que conheço,<br />
vou condenan<strong>do</strong>, que sempre é mais seguro!» 36 . A eficácia grosseira <strong>do</strong><br />
Tribunal Militar Especial – de que é exemplo o testemunho supracita<strong>do</strong><br />
– levou à sua extinção em Outubro de 1945, e à sua substituição<br />
pelos Plenários Criminais de Lisboa e Porto, constituí<strong>do</strong>s apenas por<br />
magistra<strong>do</strong>s de carreira e para onde transitaram as competências <strong>do</strong><br />
anterior; teoricamente inamovíveis e vitalícios – como preceituava a<br />
Constituição – a sua independência, porém, era nula, «uma vez que<br />
não eram nomea<strong>do</strong>s por um Conselho Supremo <strong>do</strong>s seus pares, mas<br />
sim pelo Ministro da Justiça – o que equivalia a dizer por Salazar» 37 ;<br />
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34 José Magalhães Godinho, Pedaços da minha vida, Lisboa, Pégaso Editores, 1992,<br />
pp. 25-26.<br />
35 Idem, ibidem, p. 26.<br />
36 Apud José Magalhães Godinho, op. cit, p. p. 26.<br />
37 Ramos de Almeida, op. cit., pp. 103-104.